Refutação de todas as heresias/I/Prefácio: diferenças entre revisões

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|autor=Hipólito de Roma
|autor=Hipólito de Roma
|seção=O Prefácio – Motivos para empreender a refutação; expor os antigos mistérios; plano de trabalho; integridade da refutação; valor da orba para futuras gerações
|seção=O Prefácio – Motivos para levar adiante a obra; exposição dos antigos mistérios; plano de trabalho; integridade da refutação; valor do tratado para futuras gerações
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Nós não podemos negligenciar <ref>Um hiato no início dessa passagem é aparente.</ref> nenhuma estória deixada por esses denominados filósofos entre os gregos. Suas doutrinas incoerentes devem ser recebidas com algum crédito, na excessiva loucura dos heréticos; quem, da prática do silêncio, e de guardar segredos de seus próprios mistérios inefáveis, tenham sido supostos adoradores de Deus <ref>Uma defesa elaborada dessa posição é o principal tópico do grande trabalho de Cudworth, The True Intellectual System of the Universe.</ref>. Nós temos igualmente, numa ocasião anterior <ref>Essa afirmação é tida como argumento contra a autoria de Orígenes, em favor de Epifânio, que escreveu um extenso tratado sobre heresias, com resumo.</ref>, exposto as doutrinas resumidamente, não ilustrando com minúcias, mas refutando numa resenha normal; não tendo considerado o requisito de trazer à luz suas doutrinas secretas <ref>Isto é, seus mistérios esotéricos, que são só para alguns, contrastando com exotérico, feitos para uma difusão maior.</ref>, em sua ordem, quando nós explicamos suas doutrinas enigmáticas, eles ficam envergonhados, para que também, por nossa divulgação de seus mistérios, possamos convencê-los de ateísmo, podendo induzi-los para desistir em algum grau de suas opiniões irracionais e suas tentativas profanas <ref>Em alguns manuscritos está escrito: “opinião profana e tentativa irracional”.</ref>. Mas, desde que eu percebi que eles não ficam envergonhados por nossa clemência, não tinha idéia de como Deus é paciente, ainda que seja blasfemado por eles, na ordem que ficam envergonhados e se arrependem, ou deveriam eles perseverar, ser justamente condenados, eu sou forçado a proceder em minha intenção de expor seus mistérios secretos, os quais, para o iniciado, com uma vasta quantidade de plausibilidade que eles entregam a quem não está acostumado primeiro a revelar (para qualquer um), até, aguardando deste modo em suspense durante um período (de preparação necessária), e rendendo blasfêmias contra o verdadeiro Deus, eles adquiriram completo domínio sobre ele, e perceberam suas impulsivas e cansativas depois da prometida revelação. E então, quando foram testados para serem escravizados pelo pecado, eles os iniciaram, pondo-os em possessão completa das coisas más. Previamente, entretanto, eles prenderam-nos com um juramento para nunca divulgar (os mistérios), nem para manter comunicações com qualquer pessoa, a não ser que tenha a mesma sujeição, ainda, quando a doutrina foi simplesmente entregue (para o outro), não há necessidade de um juramento. Para ele que foi ordenado a se submeter à purificação <ref>“Ao aprendizado” (Roeper).</ref> necessária, e então receberam os perfeitos mistérios desses homens, agindo pr si mesmo, tendo por referência suas próprias consciências, sentido-se suficientemente apto para não divulgar a outros; para se expor a maldade desta descrição para qualquer homem, ele poderia nem ser mais reconhecido com homem, nem ser levado a crer valiosamente para a luz, sendo que nem mesmo animais irracionais <ref>“E aqueles que são animais irracionais não tentam”, ou “por serem irracionais”, etc. A última palavra é da leitura de Sancroft; no texto, Roeper.</ref> poderiam tentar uma perversidade, enquanto nós explicarmos quando tratar dos devidos tópicos.
Nós não podemos negligenciar <ref>Um hiato no início dessa passagem é aparente (ou seja há motivos para acreditar que haja uma parte faltando).</ref> as estórias deixadas pelos assim chamados filósofos entre os gregos. Mesmo suas doutrinas incoerentes devem ser recebidas com algum crédito, de acordo com a loucura incrível dos heréticos; os quais, silenciando-se, e guardando segredos de seus próprios mistérios inefáveis, possam ter sido adoradores de Deus<ref>Uma defesa elaborada dessa posição é o principal tópico do grande trabalho de Cudworth, ''The True Intellectual System of the Universe''.</ref>. Nós também, numa ocasião anterior<ref>Essa afirmação é tida como argumento contra a autoria de Orígenes, em favor de Epifânio, que escreveu um extenso tratado sobre heresias, com resumo.</ref>, já tínhamos exposto as doutrinas resumidamente, não tratando as minúcias, mas refutando numa resenha básica; não considerando requisito revelar suas doutrinas secretas<ref>Isto é, seus mistérios esotéricos, que são só para alguns, contrastando com exotérico, feitos para uma difusão maior.</ref>, a fim de que, quando forem explicadas suas doutrinas enigmáticas, eles podem ficar encabulados, assim, pela divulgação de seus mistérios, possamos convencê-los do ateísmo, podendo assim convencê-los a desistir, em algum grau, de suas opiniões irracionais e suas tentativas profanas<ref>Em alguns manuscritos está escrito: “opinião profana e tentativa irracional”.</ref>. Mas, desde que eu percebi que eles não ficam envergonhados por nossa clemência, e não tinha idéia de como Deus é paciente, ainda que seja blasfemado por eles, para que fiquem envergonhados e se arrependam, ou eles perseverar e serem justamente condenados, eu sou forçado a proceder em minha intenção de expor seus mistérios secretos, os quais, para o iniciado, entregam com muito empenho a aqueles que não estão acostumados, primeiro para revelar (para qualquer um), até, aguardando em suspense durante um período (de preparação necessária), e dirigindo blasfêmias contra o verdadeiro Deus para que eles adquiram completo domínio sobre o iniciado, e perceberam que está impulsivo e ansioso pela prometida revelação. E então, quando forem testados para serem escravizados pelo pecado, eles o iniciem, fazendo com que fique em completa possessão do maligno. Previamente, entretanto, eles os obrigam a fazer um juramento para nunca divulgar (os mistérios), nem para manter comunicações com qualquer pessoa, a não ser que tenha o mesmo jugo, que a doutrina foi simplesmente entregue (para o outro), não há necessidade de um juramento. Ele também foi obrigado a se submeter à purificação<ref>"Ao aprendizado” (Roeper).</ref> necessária, e assim recebem os mistérios perfeitos desses homens, agindo pr si mesmo, tendo por referência sua própria consciência, sentirá-se suficientemente apto para não divulgar a outros; porque se ele revelar a maldade desta descrição para qualquer homem, ele poderia nem ser mais reconhecido como homem, nem ser levado a crer valiosamente para a luz, sendo que nem mesmo animais irracionais<ref>“E aqueles que são animais irracionais não tentam”, ou “por serem irracionais”, etc. A última palavra é da leitura de Sancroft; no texto, Roeper.</ref> poderiam tentar isso, conforme nós explicaremos no seu devido tópico.


Já que a razão nos compele <ref>“Eleva a” (Roeper).</ref> a nos aprofundar nas partes da narrativa, nós concluímos que não devemos ficar silenciosos, mas expondo as doutrinas de várias escolas com calmas, sem demonstrar reservas. Agora nos é conveniente não retrairmos a nossa investigação, e não fazer um texto pequeno só por causa do trabalho; porque nós não devemos deixar de expor nenhum desses auxílios fúteis e recorrentes para a vida humana, que escrevemos para mostrá-los em uma luz óbvia seus ritos clandestinos e orgias secretas, mantidas sob seus auspícios para os iniciados. Mas ninguém pode refutá-los, senão o Espírito Santo, legado à Igreja, recebido inicialmente pelos Apóstolos, que transmitiram àqueles que acreditam justamente. Nós, sendo seus sucessores, e como participantes de Sua graça, sacerdotes, e tendo o ofício de ensinar <ref>Essa passagem é citada para aqueles que impugnam a autoria de Orígenes, já que ele nunca foi bispo da igreja. Entretanto, não é certo que se refira exclusivamente ao cargo episcopal.</ref>, assim também reputados como os guardiões da Igreja, nós não devemos ser desleixados na vigilância <ref>A leitura comum está no futuro, mas a flexão no presente é adotada por Richter, em ''Critical Observations'', p. 77.</ref> ou estar dispostos a suprimir a doutrina cristã <ref>Deve ser “qualquer opinião que deva útil a aquela adotada”. Esta é da versão latina de Cruicer. Uma leitura diferente é “nós não devemos silenciar em relação às boas razões” ou “em relação a distinções racionais” ou “deter a fala através do instrumento do raciocínio”. Esta última é de Roeper.</ref>. Nem mesmo, trabalhando com cada energia do corpo e da alma, nós nos cansamos na nossa tentativa de render adequadamente ao nosso Divino Benfeitor um retorno apropriado; e ainda que nós não O retribuamos de uma maneira adequada, nós não seremos descuidados, nós nos descuidaremos em perder a confiança que nos foi entregue, nem revelar da má vontade o que o Espírito Santo nos fornece <ref>Outra leitura é “nos ajunta” (no sentido de ajuntar sabedoria).</ref>, não apenas trazendo-as à luz, por meio de nossa refutação, problemas alheios (ao nosso tempo), mas também qualquer assunto que a Verdade recebeu pela graça do Pai <ref>Ou “do Espírito”.</ref>, ministrou aos homens. Estes também, ilustrando com argumentos e provendo testemunhos <ref>Ou “indicando uma testemunha” ou “tendo testemunho comprovado”.</ref> por cartas, devemos proclamar de cabeça erguida.
Já que a razão nos compele<ref>“Eleva até” (Roeper).</ref> a nos aprofundar na narrativa, nós concluímos que não devemos ficar silenciosos, mas devemos expor as doutrinas de várias escolas com calma, sem demonstrar reservas. É bom que, mesmo à custa de uma investigação mais detalhada, e não fazer um texto pequeno só por causa do trabalho; porque nós não devemos deixar de expor nenhum desses auxílios fúteis para a vida humana contra o erro, e todos saberão de seus ritos clandestinos e orgias secretas, mantidas sob seus auspícios apenas para os iniciados. Mas ninguém pode refutá-los, senão o Espírito Santo, legado à Igreja, recebido inicialmente pelos Apóstolos, que transmitiram àqueles que acreditam piamente. Nós, sendo seus sucessores, e como participantes de Sua graça, sacerdotes, e tendo o ofício de ensinar<ref>Essa passagem é citada para aqueles que impugnam a autoria de Orígenes, já que ele nunca foi bispo da igreja. Entretanto, não é certo que se refira exclusivamente ao cargo episcopal.</ref>, assim também reputados como os guardiões da Igreja, nós não devemos ser desleixados na vigilância<ref>A leitura comum está no futuro, mas a flexão no presente é adotada por Richter, em ''Critical Observations'', p. 77.</ref> ou estar dispostos a suprimir a doutrina cristã<ref> Deve ser “qualquer opinião que seja própria do assunto”. Esta é da versão latina de Cruice. Uma leitura diferente é “nós não devemos silenciar em relação às boas razões” ou “em relação a distinções racionais” ou “deter a fala através do instrumento do raciocínio”. Esta última é de Roeper.</ref>. Nem mesmo, trabalhando com cada energia do corpo e da alma, nós nos cansamos na nossa tentativa de louvar adequadamente ao nosso Divino Benfeitor com um retorno digno; e ainda que nós não O louvemos de uma maneira adequada, nós não seremos descuidados, nós não nos descuidaremos em fazer o dever que nos foi entregue, nem revelar da má vontade o que o Espírito Santo nos fornece<ref>Outra leitura é “nos ajunta” (no sentido de ajuntar sabedoria).</ref>, não apenas trazendo-as à luz, por meio de nossa refutação, problemas alheios (ao nosso tempo), mas também qualquer assunto que a Verdade recebeu pela graça do Pai<ref>Ou “do Espírito”.</ref>, ministrou aos homens. Estes também, ilustrando com argumentos e fornecendo testemunhos<ref>Ou “indicando uma testemunha” ou “tendo testemunho comprovado”.</ref> por cartas, devemos proclamar de cabeça erguida.


Pela ordem, que nós já dissemos, nós provaremos que eles são ateístas, tanto em suas opiniões quanto em seu modo (de tratar uma questão), de, de fato, (na ordem demonstrada), de onde vieram suas teorias, e como eles se esforçaram para estabelecer suas doutrinas, não utilizando as Escrituras – nem é para preservar a sucessão de qualquer santo que eles apressaram suas opiniões – mas que suas doutrinas derivaram <ref>Ou “ponto inicial”.</ref> da sabedoria dos gregos, daqueles que tinham formado sistemas de filosofia, de supostos mistérios, de vagarias de astrólogos – parece, então, aconselhável, em primeira instância, ao explicar as opiniões dos filósofos gregos, para satisfazer os nossos leitores que tais coisas são muito mais antigas do que essas (heresias modernas), e sendo referenciado suas visões da divindade; depois, comparar cada heresia com o sistema de cada especulador, assim para mostrar como o primeiro campeão das heresias, se aproveitando destas teorias, já que se tornou vantajoso<ref>Ou “devotando sua atenção” ou “tendo se iluminado”.</ref>, para ele, impelindo-os para pior, construiu a sua própria doutrina. A incumbência admitida é cheia de trabalho, sendo (um) que requer pesquisa extensa. Nós não devemos, entretanto, ser deficientes na ação; porque logo após haverá alegria, como um atleta que obteve com muita labuta a coroa, ou um marido que goza dos frutos com o suor no rosto, ou um profeta que após provações e insultos vê suas profecias se tornando realidade. Assim, a princípio, devemos declarar quem foi o primeiro a desenvolver (os princípios) da filosofia natural. Já que os heréticos de hoje tomam suas heresias <ref>Os principais escritores sobre as primeiras heresias são Irineu do 2º século; Hipólito, seu aluno, do 3º; Filastro, Epifânio e Santo Agostinho do 4º século. Os ensinados mal precisam ser lembrados pelo digesto compreensivo fornecido por Ittigius, no prefácio de sua dissertação sobre as heresias nos períodos apostólicos e pós-apostólicos. Um livro dirigido ao leitor geral é ''Inquiry into the Heresies of the Apostolic Age'', do dr. Burton.</ref> dos antigos, e estas foram passadas de um para outro, devemos provar comparando um com os outros. Examinando a cada um estes que tomaram a liderança entre os filósofos com suas doutrinas peculiares, nós devemos expor publicamente esses heresiarcas.
Assim, como já dissemos, nós provaremos que eles são ateístas, tanto em suas opiniões quanto em seu método (de tratar uma questão), e de fato, (a fim de mostrar) de onde vieram suas teorias, e como eles se esforçaram para estabelecer suas doutrinas, não utilizando as Escrituras – nem para reivindicar suceder qualquer santo para qualificar suas opiniões – mas que suas doutrinas derivaram<ref>Ou “ponto inicial”.</ref> da sabedoria dos gregos, daqueles que tinham formado sistemas de filosofia, de supostos mistérios, de vagarias de astrólogos – parece então, aconselhável, em primeira instância, explicar as opiniões dos filósofos gregos, para tornar claro aos nossos leitores que tais coisas são muito mais antigas do que essas (heresias modernas), e pro referência, reverenciando as suas visões da divindade; depois, comparar cada heresia com o sistema de cada especulador, assim para mostrar como os primeiros campeões das heresias, aproveitando-se das teorias antigas, já que se tornou vantajoso<ref>Ou “devotando sua atenção” ou “tendo se iluminado”.</ref>, para eles, piorando a situação com mais heresias. A incumbência admitida é trabalhosa, requerendo pesquisa extensa. Nós não devemos, entretanto, ser relaxados na obra; porque logo após haverá alegria, como um atleta que obteve com muito esforço conquista a coroa, ou um mercador viajando pelo mar ganhando dinheiro, ou um marido que goza dos frutos com o suor no rosto, ou um profeta que após provações e insultos vê suas profecias se tornando realidade. Assim, a princípio, devemos declarar quem foi o primeiro entre os gregos a desenvolver (os princípios) da filosofia natural. Já que os heréticos de hoje tomam suas heresias<ref>Os principais escritores sobre as primeiras heresias são Irineu do 2º século; Hipólito, seu aluno, do 3º; Filastro, Epifânio e Santo Agostinho do 4º século. Os ensinados mal precisam ser lembrados pelo digesto compreensivo fornecido por Ittigius, no prefácio de sua dissertação sobre as heresias nos períodos apostólicos e pós-apostólicos. Um livro dirigido ao leitor geral é ''Inquiry into the Heresies of the Apostolic Age'', do dr. Burton.</ref> dos antigos, e estas foram passadas de um para outro, devemos provar comparando um com os outros. Examinando a cada um estes que tomaram a liderança entre os filósofos com suas doutrinas peculiares, nós devemos expor publicamente esses heresiarcas.


==Notas==
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[[Categoria:Refutação de todas as heresias]]
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[[en:Ante-Nicene Fathers/Volume V/Hippolytus/The Refutation of All Heresies/Book I/Part 2]]

Revisão das 19h56min de 9 de agosto de 2008

Nós não podemos negligenciar [1] as estórias deixadas pelos assim chamados filósofos entre os gregos. Mesmo suas doutrinas incoerentes devem ser recebidas com algum crédito, de acordo com a loucura incrível dos heréticos; os quais, silenciando-se, e guardando segredos de seus próprios mistérios inefáveis, possam ter sido adoradores de Deus[2]. Nós também, numa ocasião anterior[3], já tínhamos exposto as doutrinas resumidamente, não tratando as minúcias, mas refutando numa resenha básica; não considerando requisito revelar suas doutrinas secretas[4], a fim de que, quando forem explicadas suas doutrinas enigmáticas, eles podem ficar encabulados, assim, pela divulgação de seus mistérios, possamos convencê-los do ateísmo, podendo assim convencê-los a desistir, em algum grau, de suas opiniões irracionais e suas tentativas profanas[5]. Mas, desde que eu percebi que eles não ficam envergonhados por nossa clemência, e não tinha idéia de como Deus é paciente, ainda que seja blasfemado por eles, para que fiquem envergonhados e se arrependam, ou eles perseverar e serem justamente condenados, eu sou forçado a proceder em minha intenção de expor seus mistérios secretos, os quais, para o iniciado, entregam com muito empenho a aqueles que não estão acostumados, primeiro para revelar (para qualquer um), até, aguardando em suspense durante um período (de preparação necessária), e dirigindo blasfêmias contra o verdadeiro Deus para que eles adquiram completo domínio sobre o iniciado, e perceberam que está impulsivo e ansioso pela prometida revelação. E então, quando forem testados para serem escravizados pelo pecado, eles o iniciem, fazendo com que fique em completa possessão do maligno. Previamente, entretanto, eles os obrigam a fazer um juramento para nunca divulgar (os mistérios), nem para manter comunicações com qualquer pessoa, a não ser que tenha o mesmo jugo, já que a doutrina foi simplesmente entregue (para o outro), não há necessidade de um juramento. Ele também foi obrigado a se submeter à purificação[6] necessária, e assim recebem os mistérios perfeitos desses homens, agindo pr si mesmo, tendo por referência sua própria consciência, sentirá-se suficientemente apto para não divulgar a outros; porque se ele revelar a maldade desta descrição para qualquer homem, ele poderia nem ser mais reconhecido como homem, nem ser levado a crer valiosamente para a luz, sendo que nem mesmo animais irracionais[7] poderiam tentar isso, conforme nós explicaremos no seu devido tópico.

Já que a razão nos compele[8] a nos aprofundar na narrativa, nós concluímos que não devemos ficar silenciosos, mas devemos expor as doutrinas de várias escolas com calma, sem demonstrar reservas. É bom que, mesmo à custa de uma investigação mais detalhada, e não fazer um texto pequeno só por causa do trabalho; porque nós não devemos deixar de expor nenhum desses auxílios fúteis para a vida humana contra o erro, e todos saberão de seus ritos clandestinos e orgias secretas, mantidas sob seus auspícios apenas para os iniciados. Mas ninguém pode refutá-los, senão o Espírito Santo, legado à Igreja, recebido inicialmente pelos Apóstolos, que transmitiram àqueles que acreditam piamente. Nós, sendo seus sucessores, e como participantes de Sua graça, sacerdotes, e tendo o ofício de ensinar[9], assim também reputados como os guardiões da Igreja, nós não devemos ser desleixados na vigilância[10] ou estar dispostos a suprimir a doutrina cristã[11]. Nem mesmo, trabalhando com cada energia do corpo e da alma, nós nos cansamos na nossa tentativa de louvar adequadamente ao nosso Divino Benfeitor com um retorno digno; e ainda que nós não O louvemos de uma maneira adequada, nós não seremos descuidados, nós não nos descuidaremos em fazer o dever que nos foi entregue, nem revelar da má vontade o que o Espírito Santo nos fornece[12], não apenas trazendo-as à luz, por meio de nossa refutação, problemas alheios (ao nosso tempo), mas também qualquer assunto que a Verdade recebeu pela graça do Pai[13], ministrou aos homens. Estes também, ilustrando com argumentos e fornecendo testemunhos[14] por cartas, devemos proclamar de cabeça erguida.

Assim, como já dissemos, nós provaremos que eles são ateístas, tanto em suas opiniões quanto em seu método (de tratar uma questão), e de fato, (a fim de mostrar) de onde vieram suas teorias, e como eles se esforçaram para estabelecer suas doutrinas, não utilizando as Escrituras – nem para reivindicar suceder qualquer santo para qualificar suas opiniões – mas que suas doutrinas derivaram[15] da sabedoria dos gregos, daqueles que tinham formado sistemas de filosofia, de supostos mistérios, de vagarias de astrólogos – parece então, aconselhável, em primeira instância, explicar as opiniões dos filósofos gregos, para tornar claro aos nossos leitores que tais coisas são muito mais antigas do que essas (heresias modernas), e pro referência, reverenciando as suas visões da divindade; depois, comparar cada heresia com o sistema de cada especulador, assim para mostrar como os primeiros campeões das heresias, aproveitando-se das teorias antigas, já que se tornou vantajoso[16], para eles, piorando a situação com mais heresias. A incumbência admitida é trabalhosa, requerendo pesquisa extensa. Nós não devemos, entretanto, ser relaxados na obra; porque logo após haverá alegria, como um atleta que obteve com muito esforço conquista a coroa, ou um mercador viajando pelo mar ganhando dinheiro, ou um marido que goza dos frutos com o suor no rosto, ou um profeta que após provações e insultos vê suas profecias se tornando realidade. Assim, a princípio, devemos declarar quem foi o primeiro entre os gregos a desenvolver (os princípios) da filosofia natural. Já que os heréticos de hoje tomam suas heresias[17] dos antigos, e estas foram passadas de um para outro, devemos provar comparando um com os outros. Examinando a cada um estes que tomaram a liderança entre os filósofos com suas doutrinas peculiares, nós devemos expor publicamente esses heresiarcas.

Notas

  1. Um hiato no início dessa passagem é aparente (ou seja há motivos para acreditar que haja uma parte faltando).
  2. Uma defesa elaborada dessa posição é o principal tópico do grande trabalho de Cudworth, The True Intellectual System of the Universe.
  3. Essa afirmação é tida como argumento contra a autoria de Orígenes, em favor de Epifânio, que escreveu um extenso tratado sobre heresias, com resumo.
  4. Isto é, seus mistérios esotéricos, que são só para alguns, contrastando com exotérico, feitos para uma difusão maior.
  5. Em alguns manuscritos está escrito: “opinião profana e tentativa irracional”.
  6. "Ao aprendizado” (Roeper).
  7. “E aqueles que são animais irracionais não tentam”, ou “por serem irracionais”, etc. A última palavra é da leitura de Sancroft; no texto, Roeper.
  8. “Eleva até” (Roeper).
  9. Essa passagem é citada para aqueles que impugnam a autoria de Orígenes, já que ele nunca foi bispo da igreja. Entretanto, não é certo que se refira exclusivamente ao cargo episcopal.
  10. A leitura comum está no futuro, mas a flexão no presente é adotada por Richter, em Critical Observations, p. 77.
  11. Deve ser “qualquer opinião que seja própria do assunto”. Esta é da versão latina de Cruice. Uma leitura diferente é “nós não devemos silenciar em relação às boas razões” ou “em relação a distinções racionais” ou “deter a fala através do instrumento do raciocínio”. Esta última é de Roeper.
  12. Outra leitura é “nos ajunta” (no sentido de ajuntar sabedoria).
  13. Ou “do Espírito”.
  14. Ou “indicando uma testemunha” ou “tendo testemunho comprovado”.
  15. Ou “ponto inicial”.
  16. Ou “devotando sua atenção” ou “tendo se iluminado”.
  17. Os principais escritores sobre as primeiras heresias são Irineu do 2º século; Hipólito, seu aluno, do 3º; Filastro, Epifânio e Santo Agostinho do 4º século. Os ensinados mal precisam ser lembrados pelo digesto compreensivo fornecido por Ittigius, no prefácio de sua dissertação sobre as heresias nos períodos apostólicos e pós-apostólicos. Um livro dirigido ao leitor geral é Inquiry into the Heresies of the Apostolic Age, do dr. Burton.