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diz: "Oh! minha irmazinha, dentro em breve serás como nós uma arvore, uma flôr, um atomo, um cofrezinho de sandalo, recebe pois a nossa homenagem..." Seus actos, seus pensamentos, suas palavras se orlavam da seguinte phrase: "E´ a ultima vez".

Seus conceitos saltavam do principio ao fim, sem evoluirem, sem conjectura intermediaria, sem meandro de raciocinio; nos rebentos apenas nascidos, no que era ainda tenro, infantil, novo, lindo, reluzente, exuberante, ella ajoujava a ideia de eversão, de desfecho. Laborava-lhe em o espirito, em o corpo qual labareda ductil, nervosa, irrequieta, desvairada a convicção, a certeza de ser a justificação da morte. Os trabalhos de sua imaginação eram a ulha, o combustivel, o viço jovem, precioso, fecundo; o facho ateado, os cocáres accesos que a incitavam, a atiçavam, a faziam doirar, esplender, luzir esse symbolo desnorteante, essa realidade que lhe offerecia o deleite estranho do Desconhecido.

Findo o jantar, Ladice mandou abrir uma garrafa de champanha para festejar a entrada do mez de Maio, "mez do amôr immaculado e do amôr profano" — dizia ella.

Habituado ao genio versatil, nos caprichos romanticos de sua mulher, Francisco se não surprehendeu com esse pedido. Erguendo a taça:

— Que te possa vêr até a velhice, muito branca e muito curvadinha...

— Que Deus t´o não conceda esse desejo proferiu ella assustada. — Bebo á minha morte prematura — murmurou; e olhando a taça que havia ainda em a