Página:A cidade e as serras (1901).pdf/385

Wikisource, a biblioteca livre
A cidade e as serras
371

recentemente espanejada, reluzia, com as suas engrenagens, tubos, rodas, rigidezes de metaes, n’uma frieza inerte, na inactividade definitiva das cousas desusadas, como já dispostas n’um Museu, para exemplificar a instrumentação caduca d’um mundo passado. Tentei mover o telephone, que se não moveu; a mola da electricidade não accendeu nenhum lume: todas as forças universaes tinham abandonado o serviço do 202, como servos despedidos. E então, passeando atravez das salas, realmente me pareceu que percorria um museu d’antiguidades; e que mais tarde outros homens, com uma comprehensão mais pura e exacta da Vida e da Felicidade, percorreriam como eu, longas salas, atulhadas com os instrumentos da Super-Civilisação, e, como eu, encolheriam desdenhosamente os hombros ante a grande Illusão que findára, agora para sempre inutil, arrumada como um lixo historico, guardada debaixo de lona.

Quando sahi do 202 tomei um fiacre, subi ao Bosque de Bolonha. E apenas rolára momentos pela avenida das Acacias, no silencio decoroso, unicamente cortado pelo tilintar dos freios e pelas rodas vagarosas esmagando a areia, comecei a reconhecer as velhas figuras, sempre com o mesmo sorriso, o mesmo pó d’arroz; as mesmas palpebras amortecidas,