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CARTAS DE INGLATERRA
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faz camisas para os pequenos Patagonios, ensina a ler os filhos dos caseiros, escreve as suas memorias ou corresponde-se com um Theologo sobre pontos difficeis de doutrina. Mas um dama das dez mil não faz nada; os seus grandes talentos, a toilette, a graça de receber, a intriga politica, o brilho da conversação, o chic esthetico, cousas em que prima, não lhe servem no isolamento relativo do castello, sob as torrentes da chuva. O seu palco natural é o salão de Londres. Alli no campo, nas longas galerias onde pendem as bandeiras que os seus antepassados tomaram em Azincourt ou Poitiers, ou, se os avósinhos nunca invadiram a França, as bandeiras compradas no antiquario da esquina, Mylady boceja; ou estendida n’um sofá, na sua robe-de-chambre de brocado branco de Genova, com uma novella cahida no regaço, olha os flocos de neve empoando os grandes carvalhos do parque...

Depois vem a noite. É o peior. Os homens que fizeram talvez cinco legoas de galope atraz das rapozas, ou que se estiveram adestrando em jogos athleticos, têm somno. De gardenia na casaca e perola negra na camisa, estendidos para o fundo do sofá, derreados, meio adormentados pelo Nocturno de Chopin que um anjo louro preludia ao fundo da sala, são tão inuteis para a flirtation, o espirito, a intriga, o amor, como se fossem empalhados.