Página:Historias e sonhos - contos (1920).djvu/93

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Não trabalhava mais. Adélia rogou, pediu, chorou. Andou por aqui e por ali. Encontrou alguém amável que a convidou:

— Vamos até lá, é perto.

— Ó... Não... “Ele”...

— “Ele”!... Vamos!... “Ele” não sabe; não pode mais. Vamos.

Foi, e foi muitas vezes; mas sempre sem pesar, sem compreender bem o que fazia, à espera das caravelas sonhadas.

Ia e voltava. O marido tossia e tomava remédios.

— Trouxeste?

— Sim; trouxe.

— Quem te deu?

— O doutor.

— Como ele é bom.

Aos poucos, infiltravam-se-lhe gostos novos. Um sapato de abotoar, um chapéu de plumas, uma luva... Morreu o marido. O enterro foi fácil e o luto ficou-lhe bem. O seu olhar vago, fora dos homens e das coisas, atravessava o véu negro como um firmamento com uma única estrela no engaste de um céu de borrasca. Um ano depois corria confeitarias, à tarde; mas o seu olhar não pousava nunca nos espelhos e nas armações. Andava longe dela, longe daqueles lugares.

— Toma vermute?

— Sim.

— É melhor coquetel.

— É.

— Antes cerveja.

— Vá cerveja.

Não custou a embriagar-se um dia. Meteram-lhe num carro. Estava que nem uma pasta mole e desconjuntada.

— Que tem você?

— Nada, não vejo.

— Você por que não abre mais os olhos?

— Não posso, não vejo!

— Lá vão os Fenianos... Você não vê?