Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/88

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beber, mas não tinha água no quarto. Lembrou-se então que na sala de jantar havia uma bilha de Extremoz com água fresca, muito boa, da nascente do Morenal. Calçou as chinelas, tomou o castiçal, subiu devagarinho. Havia luz na sala, estava o reposteiro corrido; ergueu-o e recuou com um ah! Vira num relance Amélia, em saia branca a desfazer o atacador do colete; estava junto do candeeiro e as mangas curtas, o decote da camisa deixavam ver os seus braços brancos, o seio delicioso. Ela deu um pequeno grito, correu para o quarto.

Amaro ficou imóvel, com um suor à raiz dos cabelos. Poderiam suspeitar uma ofensa! Palavras indignadas iam sair decerto através do reposteiro do quarto, que ainda se balouçava agitado!

Mas a voz de Amélia, serena, perguntou de dentro:

— Que queria, senhor pároco?

— Vinha buscar água, balbuciou ele.

— Aquela Ruça! aquela desleixada! Desculpe, senhor pároco, desculpe. Olhe aí ao pé da mesa, a bilha. Achou?

— Achei! achei!

Desceu devagar com o copo cheio: a mão tremia-lhe, a água escorria-lhe pelos dedos.

Deitou-se sem rezar. Alta noite Amélia sentiu por baixo passos nervosos pisarem o soalho: era Amaro que, com o capote aos ombros e em chinelas, fumava, excitado, pelo quarto.