Página:O cortiço.djvu/207

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até formar-se em torno dela uma floresta vermelha, cor de sangue, onde largos tinhorões rubros se agitavam lentamente.

E viu-se nua, toda nua, exposta ao céu, sob a tépida luz de um sol embriagador, que lhe batia de chapa sobre os seios.

Mas, pouco a pouco, seus olhos, posto que bem abertos, nada mais enxergavam do que uma grande claridade palpitante, onde o sol, feito de uma só mancha reluzente, oscilava como um pêndulo fantástico.

Entretanto, notava que, em volta da sua nudez alourada pela luz, iam-se formando ondulantes camadas sangüíneas, que se agitavam, desprendendo aromas de flor. E, rodando o olhar, percebeu, cheia de encantos, que se achava deitada entre pétalas gigantescas, no regaço de uma rosa interminável, em que seu corpo se atufava como em ninho de veludo carmesim, bordado de ouro, fofo, macio, trescalante e morno.

E suspirando, espreguiçou-se toda num enleio de volúpia ascética.

Lá do alto o sol a fitava obstinadamente, enamorado das suas mimosas formas de menina.

Ela sorriu para ele, requebrando os olhos, e então o fogoso astro tremeu e agitou-se, e, desdobrando-se, abriu-se de par em par em duas asas e principiou a fremir, atraído e perplexo. Mas de repente, nem que se de improviso lhe inflamassem os desejos, precipitou-se lá de cima agitando as asas, e veio, enorme borboleta de fogo, adejar luxuriosamente em torno da imensa rosa, em cujo regaço a virgem permanecia com os peitos franqueados.