Página:Ursula (1859).djvu/10

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E mais e mais se aproximava ele do cavaleiro desmaiado; porque seus passos para ali se dirigiam, como se a Providência os guiasse. Ao endireitar-se para um bosque à cata sem dúvida da fonte que procurava, seus olhos se fixaram sobre aquele triste espetáculo.

— Deus meu! – exclamou correndo para o desconhecido.

E ao coração tocou-lhe piedoso interesse, vendo esse homem lançado por terra, tinto em seu próprio sangue, e ainda oprimido pelo animal já morto. E ao aproximar-se contemplou em silêncio o rosto desfigurado do mancebo; curvou-se e pôs-lhe a mão sobre o peito, e sentiu lá no fundo frouxas e espaçadas pulsações, e assomou-lhe ao rosto riso fagueiro de completo enlevo; da mais íntima satisfação. O mancebo respirava ainda.

— Que ventura! – então disse ele, erguendo as mãos ao céu – que ventura, podê-lo salvar!

O homem que assim falava era um pobre rapaz, que ao muito parecia contar vinte e cinco anos, e que na franca expressão de sua fisionomia deixava adivinhar toda a nobreza de um coração bem formado. O sangue africano fervia-lhe nas veias; o mísero ligava-se à odiosa cadeia da escravidão; e embalde o sangue ardente que herdara de seus pais, e que o nosso clima e a servidão não puderam resfriar, embalde – dissemos – se revoltava, porque se lhe erguia como barreira – o poder do forte contra o fraco!...

Ele entanto resignava-se; e se uma lágrima a desesperação lhe arrancava, escondia-a no fundo da sua miséria.

Assim é que o triste escravo arrasta a vida de desgostos e de martírios, sem esperança e sem gozos!

Oh! Esperança! Só a tem os desgraçados no refúgio