Página:Urupês (1919).pdf/118

Wikisource, a biblioteca livre
— 113 —

Por sobre a vegetação adormecida cahia o pallor cinereo da mingoante. Raras estrellas no céu, e na terra nenhum rumorejo além do remoto uivar de um cão — Merimbico talvez — a escandir o concerto das untanhas que coaxavam gluglus nas aguadas.

Eduardo alcançou o cemiterio.

Estava encadeado o portão.

Apoiou a testa nos frios varões de ferro e mergulhou os olhos queimados de lagrimas por entre os carneiros humildes em busca do que lhe escondia Christina .

No ar. um silencio de eternidade. A espaços as brisas carreavam o olor alacre dos cravos de defunto, que em moitas floriam aquelle triste cemiterio de aldeia.

Seu olhar pervagava de cruz em cruz na tentativa de atinar o sitio onde ella dormia o grande somno quando um rumor suspeito lhe feriu os ouvidos. Dirieis um arranhar da terra em raspões cautelosos ao qual se casava o resfolego soffrego d'uma creatura viva.

Pulsou-lhe violento o coração.

Os cabellos cresceram-lhe na cabeça.

Allucinação?

Apurou os ouvidos: o rumor extranho lá continuava vindo de um ponto sombreado de cyprestes. Firmou a vista: qualquer cousa movia-se no chão, agachada.

Subito, n'um clarão, fulgurou em sua memoria a scena do jantar, o caso da Luizinha. as palavras de Christina. Eduardo sentiu arripiarem-se-lhe os cabellos e ganho d'um panico desvairado deilou a correr, como louco, rumo á fazenda, em cujo casarão penetrou de pancada, sem folego, arquejante, lavado em suores frios, despertando de sobresalto a fa- milia adormecida.