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Com gritos de espanto, que o cansaço e o bater dos dentes entrecortavam, exclamou:

— Estão desenterrando Christina!... Eu vi uma coisa desenterrando Christina !...

O major acudiu estrouvinhado:

— Que loucura é essa, moço?

— Eu vi!... continuava Eduardo, com os olhos desmedidamente abertos. Eu vi uma coisa desenterrando Christina!...

O major apertou a testa entre as mãos. Esteve assim, immovel, um instante. Depois, sacudiu a cabeça num gesto de decisão e, horrivelmente calmo, murmurou entre dentes como em resposta a si proprio:

— Será possivel, meu Deus?

Vestiu-se de golpe, metteu no bolso o revólver e, atirando tres palavras enigmaticas á estarrecida Don'Anna, gritou para Eduardo com inflexão de aço na voz:

— Vamos!

O moço, magnetisado pela energia do velho, seguiu-o como um somnambulo.

No terreiro despertou o capataz.

— Venha comnosco. A "coisa" está no cemiterio.

— Vargas saltou para fóra do foice na mão.

— Vae ver que é elle, patrão, até juro!

O major não respondeu, e os tres homens partiram a correr pelos campos em fóra

A meio caminho Eduardo, exhausto de tanlas commoções, atrazou-se. Seus musculos recusavam-lhe obediencia. Ao defrontar com o atoleiro a perna lhe fraqueou de vez e elle cahiu, offegante.

Entrementes o major e o feitor alcançam o cemiterio, galgam o muro, e approximam-se como gatos do tumulo de Christina.

Um quadro hediondo antolha-se-lhes de golpe: um corpo branco, nu' e inerte, jazia no