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dão estafeta dos correios entre duas cidades convisinhas, não servidas de via ferrea.

O ingenua vê no caso honraria e negocio; é honra penetrar na phalange gorda dos carrapatos orçamentivoros que pacientemente digerem o paiz; é negocio perceber ao termo de cada mez um ordenado fixo tendo a rutilar no futuro a cama fôfa da aposentadoria.

Aqui nota-se a differença entre os ominosos tempos medievos e os sobreexcellentes da democracia de hoje.

O absolutismo agarrava ás brutas a victima, e sem tir-te nem "habeas-corpus", trucidava-a a democracia opera com manhas de Tartufo, arma arapucas, mette dentro rodelas de laranja e espera aleivosamente que "sponte sua" caia no laço o passarinho faminto. Quer victimas ao acaso, não escolhe. Chama-se a isto arte pela arte.

Nomeado que é o homem, a principio não percebe o palvoeirão a sua desgraça. E' de ordinario ao cabo de um mez, ou dois, que entra a desconfiar; desconfiança que por gráos se vae fazendo certeza, certeza horrivel de que o empalaram no lombilho duro do peior matungo das redondezas, com, pela frente. cinco, seis, sete leguas de tortura a engulir por dia, de mala á garupa. Eis as pu'as do apparelho de tormento, estas leguas! Para o commum dos mortaes, uma legua é uma legua; é a medida duma distancia que principia aqui e acaba lá. Quem viaja, feito o percurso, chega, e é feliz. As leguas do estafeta mal acabam voltam "da capo", como nas musicas. Vencidas as seis (supponhamos um caso em que sejam sómente seis) renascem ellas na sua frente, de volta. E' fazel-as e desfazel-as. Teia de Penelope, rochedo de