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pessoa no mundo a quem revelarei o inferno que me saiu do Paraiso.


Eis o que ouvi:

"Quando a febre amarella de Campinas orphanou Laurita, eu, como o parente melhor condicionado, trouxe-a para a minha companhia. Tinha ella cinco annos, e já prenunciava nas graças infantis a cncantadora menina que seria.

Eu estava casado de fresco. Minha mulher — não o suspeitaste naquelle jantar? — era uma crealura visceralmente má. O "má" na mulher diz tudo : dispensa maior gasto de expressões. Quando ouvires de uma mulher, que é má. não peças por mais : foge a sete pés. Se eu fora refazer o Inferno, acabaria com tantos circulos que lá poz o Dante, e em lugar delles mettia, de guarda aos precitos, uma duzia de megéras. Haviam ellas de ver que paraiso eram, em comparação, os circulos...

Confésso que me não casei por amor. Estava bacharel e pobre. Vi pela frente o marasmo das promotorias, e a victoria rapida do casamento rico. Optei pela victoria rapida. descurioso de sondar por onde me levaria a aurea vereda. O dote, grande, valia, ou pareceu-me valer o sacrificio. Errei. Com a experiencia de hoje, agarrava a mais mediocre das sinecuras. O viver que levamos não o desejo como castigo ao peior scelerado.

— A face noruega!...

— Era exacta a comparação, gelida como nos corria a vida conjugal no periodo em que, illudidos, contemporisavamos, tentando um equilibrio impossivel. Depois, tornou-se-me infernal.

Laura, á proporção que desabrochava, reunia em si quanta formosura de corpo, alma