Página:Urupês (1919).pdf/163

Wikisource, a biblioteca livre
— 158 —

depois de casado resistia, e tal firmeza encheu de assombro á "senhora". Tenho cá na visão o riso de desafio que nesse momento lhe crispou a bocca, e tenho n'alma as cicatrizes das ascuas que espirraram aquelles olhos.

Apanhei a luva.

Estas guerras conjugaes de portas a dentro!... Não ha'hi lucta civil que se lhes compare em crueza. Na frente de estranhos, de Laura e dos filhos, continha-se. Maltratava a pobre menina, mas sem revelar a verdadeira causa da perseguição.

Durou pouco isso. Escrevi a parentes, e concertava com elles a arrumação de Laura, quando... Não te recordas do bosque de pinheiros plantado em seguimento ao pomar?

— O pinhal d'Azambuja!

— Foi o nome que lhe puz, como andassem uns lagartões, seus freguezes, a me pilharem as capoeiras. Este pinhal era o passeio favorito de Laura. Emboscava-se alli com um livro, ou a costura, e dess'arte socegava um momento da inferneira domestica.

Um dia em que sahi á caça, menos pela caçada do que para retemperar-me da guerra caseira na paz das mattas, ao montar a cavallo via-a dirigir-se para lá com o cestinho do bordado. Demorei-me mais que o usual e em vez de paca trouxe uma longa meditação desanimadora, feita, inda me lembro, de papo acima, sob a fronde duma guabirobeira.

Na volta as creanças esperavam-me na escada, assustadinhas.

— Papae não viu Laura?

Estranhei a pergunta, e mais vendo approximar-se a velha Lucrecia, que disse:

— Patrão, não vá ter acontecido alguma para nha Laurinha. Sahiu cedo, antes do café, já é quasi noite e até agora nada.