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tada como alfinete na almofadinha do amor proprio. Atraz desse vieram outros, e outros, estes fincados de leve, aquelles até á cabeça.

Tudo cança. Farto de tal vida, o hilarião entrou a sonhar nas delicias de ser tomado a serio, falar e ser ouvido sem repuxo de musculos faciaes, gesticular sem promover a quebra da compostura humana, atravessar uma rua sem presentir na pin'gada um côro de "E vem o Pontes!" em tom de quem se espreme na contensão do riso ou se ageita para uma barrigada das boas.

Reagindo, tentou Pontes a seriedade. Desastre. Pontes serio mudava de tecla, cahia no humorismo inglez. Antes divertia como clown, agora como Tony.

O estrondoso exito do que se afigurou a toda a gente uma faceta nova da sua veia comica, lançou mais sombras na alma do engraçado arrependido. Era certo que se não poderia traçar outro caminho na vida além daquelle, era odioso? Palhaço, então, eternamente palhaço á força?

Mas a vida de um homem feito tem exigencias sisudas, impõe gravidade e até casmurrice dispensaveis nos annos verdes.

O cargo mais modesto da administração, uma simples vereança, requer na cara a immobilidade da idiotia que não ri. Não se concebe vereador risonho. Falta ao dito de Rapelais uma exclusão: o riso é proprio á especie humana, fóra o verador.

Com o dobar dos annos a reflexão amadureceu, o brio crystallizou-se, e os jantares cavados acabaram por saber-lhe a azedo. A moeda pilheria tornou-se-lhe dura ao cimho; já a não fundia com a frescura antiga; já usava della como expediente de vida, não por folgança despreoccupada como outr'ora.