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gargalhada igual á de Teufelsdrock diante de João Paulo Richter. Primeira e ultima, entretanto, porque em meio della os convivas attonitos viram-no cahir de borco sobre o prato, de passo que uma onda de sangue avermelhava a toalha.

O assassino ergueu-se allucinado, e aproveitando a confusão esgueirou-se para a rua, como um Cain. Escondeu-se em casa, trancou-se no quarto, bateu dentes a noite inteira e suou gelado. Os menores rumores retranziam-no de pavor: policia?

Dias mais tarde é que entrou a declinar aquelle transtorno d'alma que toda gente levava á conta de dôr pela morte do amigo. Não obstante, trazia sempre diante dos olhos a mesma visão: o velho de bruços no prato, golfando sangue, emquanto no ar, inda vibrantes, os echos da sua derradeira gargalhada.

E foi nesse deploravel estado que recebeu a carta do parente do Rio. Entre outras cousas dizia o az: "Como não me avisaste a tempo, conforme o combinado, só pelas folhas vim a saber da morte do Bentes. Fui ao ministro mas era tarde, já estava lavrada a nomeação do successor. A tua leviandade fez-te perder a melhor occasião da vida. Guarda para teu governo este latim: "tarde venientibus ossa", e sê mais esperto para o futuro".

Um mez depois encontraram-no pendurado numa trave do quarto, com a lingua de fóra, rigido.

Enforcára-se numa perna de ceroula.

Quando a noticia deu volta á cidade, toda gente achou graça no caso. O gallego do armazem commentou para os caixeiros