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com paus fiquei na supposição de que as arvores têm alma, como a gente.

— T'esconjuro! espirrou Nunes.

— Isto dizia o meu velho, eu por mim não dou opinião. E têm alma, dizia elle, porque sentem a dor e choram. Não ve como gemem certos paus, ao cair? E outros como choram tanta lagrima vermelha, que escorre, e com o sol arrezina? Ora pois têm alma, porque neste mundo tudo é criatura de Deus.

— Lá isso...

Então, dizia elle, ha em cada matto um pau, que ninguem sabe qual é, a modo que peitado para a desforra dos mais. E' o pau de feitiço.

O desgraçado que acerta metter o machado no cerne delle, pode encommendar a alma p'r'o diabo que está perdido.

Ou estrepado, ou de cabeça rachada por um galho secco que despenca de cima, ou, mais larde, por artes da obra feita com a madeira, de todo o geito não escapa. Não 'dianta se precatar, a desgraça peala mesmo, mais hoje, mais amanhã, a criatura marcada.

Isto dizia o velho, e eu por mim tenho visto muita coisa. Na derrubada do Figueirão, alembra-se? morreu o filho do Chico Pires. Estava cortando um guamerim quando de repente soltou um grito. Acode que acode, o moço estava com o peito varado até ás costas. Como foi? Como não foi? Ninguem entendeu aquillo. Meu pae ficou pensativo e disse: é feitiço de pau.

Como este, quantos casos? O mundo está cheio. O Sebastiãosinho da Ponte-Alta: fez uma casa, o pau da cumieira elle mesmo derrubou. Pois não é que a cumieira arreia e estronda a cabeça do rapaz?

Porisso o velho, sabido que era, antes de