― Não o temo... mas... devo dizer-lhe a verdade. Tenho visto seu filho por duas vezes e....
― Disse-lhe alguma coisa que a desgostasse ou offender-se?
― Não, minha senhora, balbuciou a orphã com a cabeça baixa. E' muito delicado e muito bondoso.
― Pois então anime-se. Elle a respeitará mais ainda vendo-a no seio da nossa familia. Ha-de olhal-a como irmã a quem deve protecção e respeito. Se alguma vez a menina precisar de conselhos, consulte-me, como o faria a uma amiga intima.
O coupé parou. Abriu-se a portinhola e appareceu Maximino com ar mais sério e respeitoso, dissimulando o alvoroço que lhe ia no intimo d'alma. Ajudou sua mãe a descer os degraus do carro, e lhe apertou a mão com ternura, segredando-lhe:
― Obrigado.
Voultou-se para offerecer a mão á donzella, mas ella, para evitar isto, descia só. Maximino a cortejou em silencio. Adelaide esperava-os no portal e disse ao mancebo:
― Meu filho, apresento-te uma nova irmã. Sê para ella o que és para Rufina.
― Sim, minha mãe, respondeu elle com firmeza. Esta senhora terá em mim um irmão respeitoso. Se me dão licença, vou despedir o boleeiro.
As senhoras subiram sós. Adelaide sustentava a sua nova filha que estava um pouco convulsa. No primeiro patamar das escadas estava Custodio da Cunha.
Estendeu a mão á orphã com ar commovido. Ella pegou tremula na mão que lhe era offerecida, e a levou aos labios. O ancião tinha os olhos humidos. Não teve d'esta vez a precaução de ocultar este signal de enternecimento.
― Beijou a minha mão, disse elle. Fez bem. Serei agora seu pae. Deus a abençoe como eu o faço.
E poz-lhe a mão na cabeça, que Maria Izabel curvára ao receber a bencão. Ella estava coberta de lagrimas, e o pae de Maximino custava-lhe a reter as suas. Adelaide, não menos commovida, diss, para interromper esta scena:
― Vamos para cima. Não havemos de ficar nas escadas.
E pegando no braço da menina a levou comsigo. Seu parido as seguiu. Ouviu passos a traz de si. Olhou e viu Maximino que ia entrar no seu quarto.
― Não sobes? disse o pae, que estava em maré de graças.
― Vou estudar as minhas lições, meu pae.
Custodio da Cunha subiu pensativo. Seu filho tanto nos momentos de alegria, como nos de tristeza, se unia sempre á familia, agora ia afastar-se d'ella. Aprovara este procedimento, mas entristecia-se. Não era expansivo, mas folgava de ver a expansão dos seus.
Encontrou em cima Maria Isabel nos braços de Rufina. E isto o consolou alguma coisa.
O remanso
Tinha começado para a filha da infeliz D. Maria Carlota uma época de paz e consolação. Amava e era amada pela alegre e folgazã irmã de Maximino; era tractada com desvello e carinho por Adelaide, e com amor paternal pelo ancião. Via pouco Maximino, mas vivia debaixo do mesmo tecto que elle, e isto lhe dava satisfação. O mancebo mostrava-lhe muito respeito, e tractava-a com delicadas attenções, mas fugiu de encontral-a quando alguns de seus paes não estava presente.
Rufina queixava-se muita vez da mudança que via em seu irmão, que se tornára, dizia ela, muito arisco.
Abraçava-o ás vezes, dizendo:
― Que mal te fiz? Já não és meu amigo? Não ris, nem brincas, e é preciso um gancho para te arrancar as fallas! E então como foges de nós!... Um dia tens d'estudar lição d'isto, outro, d'aquillo, agora vais á aula, logo vais á bibliotheca... ninguem te pilha um moment. Ainda o pae agora é muito mais dado com a gente.
― Minha querida Rufina ― respondeu elle