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A esperança
347

 

Clotilde


Romance original


Por

Ephigenia do Carvalhal Sousa Telles

(De pag. 332)

IV
O regresso

Oito dias são já decorridos desde o passeio á Ermida.

As duas meninas estão assentadas no jardim, e pela anciedade com que chegam á porta ao ouvirem o menor ruido vê-se que esperam alguma coiza.

― Como Leopoldo tarda ― disse Josefina com uma insofrida impaciencia.

― Não tem desculpa, redarguiu a outra menina, por que eu recommendei-lhe que não poupasse o cavallo; que o rebentasse sendo preciso para nos trazer breve a desejada carta de teu pai. Mas se elle não escreveu, é mais dois dias de horrivel incerteza que se veem juntar a estes, que já passaram?

― Não digas ao menos isso Clotilde! Escuta... parece-me que d'esta vez me não engano: é elle, é elle.

Com effeito o velho creado coberto de suor, e de poeira entrava no jardim.

― A carta, a carta ― exclamaram ambas as meninas estendendo as mãos.

― Aqui está, disse o criado ― e o ceu me conceda a felicidade de eu ser o portador da noticia das melhoras do meu querido menino. Magoava-me a ideia de o não tornar a vêr, por que lhe quer muito, trouxe-o tantas vezes ao colo!

― Que felicidade, Clotilde, ― exclamou a filha do Marquez lançando-se ao pescoço da sua amiga ― elle está livre de perigo, vê, o que me diz meu pai:

«Minha Josephina, são satisfactorias as noticias que tenho a dar-te; Paulino está livre de perigo.

«A scena que vi presenciar no dia em que cheguei, compensa com usura os desgostos que a sua molestia nos cauzou. A enfermidade tinha feito crise n'esse dia. O medico sahia do seu quarto declarando-o livre de perigo. Apenas elle sahiu, o quarto encheu-se de estudantes, e todos á porfia, queriam chegar primeiro ao leito do doente!! Eu, que entrava n'este momento, não me foi possivel chegar ao pé de Paulino se não desde que estes generosos mancebos lhe testemunharam o seu contentamento. Nunca vi um enthusiasmo tal!

«Como eu me ufano de ter um filho adorado por quantos o conhecem!...

«Eu pedia em altas vozes, que me deixassem vêr meu filho, e apenas as minhas palavras poderam ser ouvidas, todos me deram passagem, e ficaram mudos espectadores dos transportes d'um pai que torna a abraçar o seu filho caro que julgou perdido.

«O que se passou no meu coração n'este momento não posso explicar-te!... Só o condemnado, que, debroçado já sobre a prancha fatal, ouve lêr o seu perdão, poderá ter alegria comparada á que eu senti ao vêr meu filho vivo.

«Tão grande prazer tirou-me os sentidos, e eu cahi inanimado sobre a cama de Paulino.

«Quando acordei encontrei-me n'outro quarto e estava rodeado dos condiscipulos de meu filho. Foi então que elles me disseram que o medico o julgava livre de perigo; mas que tinha recommendado reinasse silencio no quarto do doente.

«Eu não achava expressões com que podesse agradecer a estes corações nobres os disvélos com que tinham tratado meu filho, mas