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MONTEIRO LOBATO
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Aquelle prego de Fazdeconta, cuja cabeça apparecia quando elle estava sem chapéu e cuja ponta furava as costas de todos os seus casacos, era um eterno assumpto de discussão no sitio. Pedrinho achava que deviam chamar o doutor Caramujo para operal-o, cortando com a sua serrinha o extravagante appendice. Mas a menina era de opinião que tal ponta de prego constituia a unica arma de defesa do coitado. Além disso, era um bom cabide que ella costumava utilizar nos seus passeios com a boneca. Para pendurar coisas leves, como o chapéu ou o guardachuvinha da Emilia, nada melhor. E foi em vista dessa utilidade que a ponta de prego ficou toda a vida nas costas do coitado.

Fazdeconta não ligou importancia ás troças que o publico fez á custa delle. Trepou num banquinho e segurou com toda a convicção o arco de papel vermelho que Emilia ia pular. A boneca botou o cavallo no galope, correu duas voltas e na terceira — zupt! deu um salto. Furou o arco, indo cahir do outro lado, depézinha sobre o cavallo.

Os espectadores romperam em palmas delirantes.

O segundo arco era de papel azul e o terceiro, de papel verde. Emilia pulou com a mesma habilidade o azul; mas no verde houve desastre. Imaginem que o cavallinho entendeu de pular tambem! Pulou, não ha duvida, mas o seu rabo de penna enganchou no prego de Fazdeconta e lá ficou dependurado.

Quando o publico viu que o rabo de penna havia passado do cavallinho para o cabide do boneco, foi uma tempestade de gargalhadas.

Fazdeconta, não percebendo o que havia acontecido, recolheu-se aos bastidores balançando ao vento aquelle pennacho. Emilia tambem não percebeu o desastre, e julgando que as risadas e vaias eram para ella, parou, vermelhinha como um camarão, botando uma lingua de dois palmos para o publico. E recolheu-se, furiosa.

— Não brinco mais! disse lá nos bastidores, arrancan-