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CONTOS E PHANTASIAS

turbilhão mundano consolação para intimas tristezas; outras, que me confessaram chorando, que a ingratidão e a inconstancia do marido as arrastára á perdição, ao desprezo de si proprias.

Não as repelli, porque não tinha direito para ser implacavel; lamentei-as, não porque as achasse dignas de lastima, mas porque me pareciam dignas de desdem!

Como se o crime posterior da mulher não fosse a justificação do crime anterior do marido!

Ser boa e digna e virtuosa, quando tudo nos ajuda a isso, grande milagre!

Na solidão, no abandono, na injustiça do mundo, é que a honestidade da mulher se acrisola!

Se meu marido não houvesse fugido de mim, deixando-me nos braços uma creancinha de mezes, como poderia eu conhecer as luctas da vida e ter sahido triumphante das provações da desgraça?

Não imaginas, querida amiga, como hoje é doce e tranquillo o meu outomno!

Em primeiro lugar o querido anjo que eu eduquei sósinha, depois a musica, as flôres e os bons livros. Falta-me a minha mãe querida, mas essa morreu abençoando-me!

Ao domingo, quando eu e Arthur nos achamos bem sós, no nosso pequeno gabinete de trabalho, chego a conceber a beatitude do paraizo.