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Santo Agostinho

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17.Augustini - Non te ergo movet, quod summus magister, cum orare doceret discipulos, verba quaedam docuit, in quo nihil aliud videtur fecisse quam docuisse, quomodo in orando loqui oporteret?

18.Adeodatus - Nihil me omnino istuc movet; non enim verba, sed res ipsas eos verbis docuit, quibus etiam se ipsi commonefacerent, a quo et quid esset orandum, cum in penetralibus ut dictum est mentis orarent.

19.Augustini - Recte intellegis; simul enim te credo animadvertere, etiamsi quisquam contendat, quamvis nullum edamus sonum, tamen, quia ipsa verba cogitamus, nos intus apud animum loqui, sic quoque locutione nihil aliud agere quam commemorare, cum memoria, cui verba inhaerent, earevolvendo facit venire in mentem res ipsas, quarum signa sunt verba.

20.Adeodatus - Intellego ac

sequor.

17.Agostinho - Não te impressionas que o supremo Mestre tenha ensinado seus discípulos a orar, ensinando por palavras, nada mais a desejar que ensinar o como deveriam se expressar ao rezar?

18.Adeodato - Nada inteiramente me demove, posto Ele não ensinasse palavras, mas as próprias coisas por palavras, para que soubessemos a quem, a que seria a oração e, o como' penetrar na mente aquilo que ao orarem era dito.

19.Agostinho — Corretamente captastes. Ademais, ao mesmo tempo creio teres pressuposto que mesmo sem emitir sons, nós refletimos sobre as palavras e falamos no íntimo de nossa alma. Assim, com a locução nada fazemos a não ser evocar à memória[1], fazendo-a agir e rememorando[2] a mente as próprias coisas das quais são signos as palavras.

20.Adeodato - Entendo e

aceito.

  1. A filosofia platônica admite a existência de dois mundos. O primeiro constituído por ideias eternas, dotadas de uma existência independente; enquanto o segundo é constituído por coisas sensíveis, partindo da ideia de que a percepção não seria digna de confiança, porque o corpo permanentemente nos engana No Fedon (1981), encontramos que a verdadeira realidade não advém da percepção e só pode ser intuída pelo uso da razão, que recorre à memória na busca por respostas de caráter geral. Socrates, ao ser questionado por Simias e Cebes, afirma: “Porque, conviemos em que é muito possível que quem sentiu uma coisa, isto é, quem viu, ouviu ou, enfim, percebeu por qualquer dos seus sentidos, pensa a respeito dela, ou em outra que esqueceu e que tem com a percebida qualquer relação, seja semelhante aquela ou não. De modo que é preciso, ou que nasçamos com esses conhecimentos e que os conservemos durante toda nossa vida, ou que os que aprendem, conforme acontece conosco, apenas recordem e assim a instrução é apenas uma reminiscências” (PLATÃO, 1981, p. 125). A teoria platônica da anamnese envolvia a alma, sábia e imortal ao nascer, através da qual poderíamos conhecer o mundo supra-sensível através da lembrança, ou seja da memória. Mas para Agostinho esta sabedoria era obscurecida pelo afastamento em relação a Deus e seus ensinamentos, assim o conhecimento só poderia ser reintegrado aos homens pela razão e pela fé (in CONTRA ACADEMICOS LIBRI III — XIII.29).
  2. Agostinho escreve sobre a memória e os sentidos: “Sim, é verdade! A não ser porque já existiriam em minha memória? Porém, elas estavam tão abrigadas e ocultas em cavernas secretíssimas que talvez não pudesse pensar nelas, se de lá não fossem arrancadas por quem me alertasse (in CONFESSIONUM LIBRI XIII - X.10.17). Á tradução de commemorare considerei sempre o contexto onde estava inserida. Em alguns casos, segui a literalidade como em 1-9, enquanto em outros, como 1-19, considerei a citação acima, traduzindo-a por evocar, chamar de algum lugar.
    Agostinho escreve sobre a memória e os sentidos: “Sim, é verdade! A não ser porque já existiriam em minha memória? Porém, elas estavam tão abrigadas e ocultas em cavernas secretíssimas que talvez não pudesse pensar nelas, se de lá não fossem arrancadas por quem me alertasse (in CONFESSIONUM LIBRI XIII - X.10.17). Á tradução de commemorare considerei sempre o contexto onde estava inserida. Em alguns casos, segui a literalidade como em 1-9, enquanto em outros, como 1-19, considerei a citação acima, traduzindo-a por evocar, chamar de algum lugar.