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o ao pé de mim o livro de Plulareho, nem ser dada a noticia nas gazetas com a da côr das calças que eu então vestia, assentei de pôl-o novamente no seu logar, antes de beber o veneno.

O copeiro trouxe o café. Ergui-me, guardei o livro, e fui para a mesa onde ficára a chicara. Já a casa estava em rumores; era tempo de acabar commigo. A mão tremeu-me ao abrir o papel em que trazia a droga embrulhada. Ainda assim tive animo de despejar a substancia na chicara, e comecei a mexer o café, os olhos vagos, a memoria em Desdemona innocente; o espectaculo da vespera vinha intrometter-se na realidade da manhã. Mas a photographia de Escobar deu-me o animo que me ia faltando; lá estava elle, com a mão nas costas da cadeira, a olhar ao longe...

— Acabemos com isto, pensei.

Quando ia a beber, cogitei se não seria melhor esperar que Capitú e o filho saissem para a missa; beberia depois; era melhor. Assim disposto, entrei a passear no gabinele. Ouvi a voz de Ezequiel no corredor, vi-o entrar e correr a mim bradando :

— Papae ! papae!

Leitor, houve aqui um gesto que eu não descrevo por havel-o inteiramente esquecido, mas crê que foi bello e tragico. Effectivamente, a figura do pequeno fez-me recuar até dar de costas na estante. Ezequiel abraçou me os joelhos, esticou-se na ponta dos pés, como querendo subir e dar-me o beijo do costume; e repetia, puxando-me :

— Papae! papae!