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MONTEIRO LOBATO

Ao dar com Dona Benta e Narizinho sentadas na raiz da sua pitangueira, Emilia largou das palhas do Visconde e este deixou de resistir à moda dos cabritos — aproximaram-se os dois.

— Que é isso, Emília? Que judiação é essa com o pobre Visconde?

Emília botou as mãos na cintura e, muito vermelha e empinadinha para trás, disse:

— Pois é este estupor que me está escondendo qualquer coisa. Cada vez que me aproximo do seu laboratório, fecha uma gaveta e disfarçadamente diz: "Olhe que nuvem bonita lá no céu, com forma de elefante!" Elefante é o nariz dele. E eu então resolvi trazê-lo perante a senhora para que me confesse. Como dona do sítio, a senhora não pode tolerar que alguém ande aqui com atitudes misteriosas.

Narizinho deu uma grande risada.

— Ora, Emilia! Pois então uma criatura que possui uma verdadeira vara de condão, como é o "faz-de-conta", não consegue descobrir o que um pobre viscondinho anda fazendo?

— É que o meu "faz-de-conta" não anda funcionando muito bem agora. Parece que se desarranjou por dentro, como a bota de sete léguas de Polegar ...

E você quer que vovó arranque do Visconde a confissão do que ele está fazendo?

— Exatamente...

Dona Benta riu-se do caso e com o seu ar bonachão interpelou o sabugo.

— Vamos, Visconde, conte à Emília o que está fazendo, já que não está fazendo nada de mal. Se há no mundo uma criatura incapaz de fazer qualquer coisa de mal, é o Visconde de Sabugosa. Todos sabemos disso.

O Visconde não ofereceu nenhuma resistência; e com a maior naturalidade foi contando que havia descoberto o "Periscópio do Invisível"; e que guardara segredo apenas por desejar fazer uma surpresa a todos.

— Que história de "Periscópio do Invisível" é essa, Visconde?