Página:Histórias diversas (Mml obr0050).pdf/5

Wikisource, a biblioteca livre

AS BOTAS DE SETE LÉGUAS



NAQUELE ENORME HOTEL de trinta andares, há um porteiro quase do tamanho de um andar. Está sempre ali pela calçada, vestido de comprida sobrecasaca cor de cinza, com uma fila de botões de metal amarelo na frente e dois atrás. Nos dias de chuva, assim que chega um automóvel com hóspede dentro, ele abre um enorme guarda-chuva vermelho e vai ao seu encontro. Para um hotel, nada mais precioso que um "hóspede". É preciso que não tome nem uma só gota de chuva.

Estava eu, certo dia, parado diante desse hotel à espera de um amigo, e a observar as manobras do porteiro gigante com o seu guarda-chuva, quando percebi uma coisinha mexendo-se na calçada. Baixei os olhos e franzi a testa. Uma coisinha viva. Besouro? Mariposa? Não. Uma gentinha! A mais galante das gentinhas! Um dos mais famosos personagens do Mundo das Fábulas: O Pequeno Polegar!...

Muito surpreendido com o encontro, peguei-o e botei-o na palma da mão.

— Polegarzinho querido, como é que se atreve a andar assim por estas ruas tão cheias de gente, com as botas-de-sete-léguas ao ombro, em vez de calçadas? Este porteiro gigante, que navega por aqui, de um momento para outro te esmaga com o seu imensíssimo pé... Como quem possui uma bota de sete léguas anda assim com ela ao ombro?

Polegar explicou que viera à cidade justamente por causa das botas. Uma delas, a do pé esquerdo, havia se desarranjado, de modo que em vez de caminhar sete léguas a cada passo que ele dava, apenas caminhava uma. Isso o impedira de usar as botas.

— Por quê?