Página:Horto (1910).djvu/245

Wikisource, a biblioteca livre


Quando a Noite vier... se no meu seio
Estremeceres cheio de receio,
- Tremendo a sombra que amortalha o Dia
E cobre a terra de melancolia, -
Longe do mundo e da desesperança,
Hei de embalar-te como uma criança.

Quero que escutes o gemer profundo
Do Mar que chora a pequenez do mundo
E ouças cantar a doce barcarola
Da noite imensa que se desenrola,
Dando perfume ao coração dos lírios,
Trazendo sonhos para os meus martírios.

E quando o Sol nascer; quando, formosa
Como uma garça branca e misteriosa,
Batendo as asas cor de neve, a Aurora
Vier cantando pelo mundo a fora,
Rufla as asas também... e forte, então,
Tu podes palpitar, meu coração!

Acorda para a Vida e canta e canta,
O Sol da Terra - iluminada e santa!
Deixa o teu sonho de saudade e dores
Dormir no seio trêmulo das flores...
E foge e foge pelo Espaço, à toa,
Pomba exilada que a seus lares voa!