Página:Lendas e Narrativas - Tomo II.djvu/131

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celebrar o Carnaval;—­e os seus bolos da Natividade—­e a sua ôlha e o seu anho assado da Paschoa. Não!—­Saudades de tudo isso, durante a minha vida inteira, em qualquer fortuna, no meio das mais graves cogitações, nunca hei-de affastar-vos impaciente quando vierdes, como creança travessa, baralhar-me um periodo de trabalhada prosa, ou aleijar-me com um verso parvo uma estrophe soffrivel. Vinde, meus amores antigos, que para vós esta fronte não saberá arrugar-se; esta bôca não terá esses monosyllabos duros e gelados com que se repellem importunações d’indifferentes. Vinde, e demorae-vos comigo, e palrae por uma hora, por um dia, por uma semana, que vos escutarei sempre sorrindo; e quando fôr ao sol posto, que os ouvidos da minha alma vos ouçam reproduzir vivas, harmoniosas, melancholicas as lentas badaladas das ave-marias, não como agora as ouço ás vezes no meio do ruído confuso, aspero, estridente do povoado, mas partindo da aldeia ainda deserta dos seus moradores, rolando pela veiga, espriguiçando-se pelo prado, rumorejando pelas quebradas da encosta ou pelo pinhal do cabeço, e indo morrer lá muito ao longe nas toadas duvidosas de uma cantiga de lavadeiras, ou no tinir das esquillas de um rebanho de ovelhas, que se encaminham