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O primeiro ímpeto de minha indignação caiu sobre Sá, em quem se encarnava o insulto vago e anônimo; cometia um excesso, se o seu olhar franco e leal não me fizesse entrar em mim.

— Então! Não te ris dessa estúpida calúnia?... Tomas isto ao sério?

— Dize-me o nome de um só dos infames que se ocupam com a minha vida. O teu dever, já que assim o chamaste, o exige, e eu te peço!

— O nome?... É o mundo, a gente, a sociedade! Vai tomar-lhe satisfações.

— Mas tu ouviste de um homem?

— Que ouviu de outro e outro. Procura numa árvore a folha que gerou e nutriu a vespa que te morde?

Sá tinha razão. Senti a impotência do homem contra a calúnia impalpável que esvoaça e zune e ferroa como a vespa, e escapa nas asas à raiva e desespero da vitima É a fábula do leão e do mosquito. Mas o que então se passou em mim lhe parecerá incrível: a minha cólera precisava desabafar-se contra alguém, e na impossibilidade de dar um corpo àquela injúria atroz, levei a ingratidão até encarná-la em Lúcia, causa inocente do que sucedia.

Ela tinha razão quando temia que as nossas relações fossem conhecidas, e quando fazia tudo por escondê-las, como se escondem à sombra as flores delicadas que o vento fresco ou o sol ardente crestam e matam.

Sai bem decidido a pôr um termo à situação vergonhosa e humilhante em que me achava colocado. As palavras de Sá me queimavam os ouvidos. Eu vivendo à custa de Lúcia, eu que esbanjava a minha pequena fortuna por ela! Mas as calúnias tinham