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XIV

Prisioneiro

 

Fiquei desanove dias recebendo unicamente os cuidados de Luiz Carniglia.

No fim d’este tempo chegámos a Gualeguay.

Tinhamos encontrado na embocadura do Ibicuhy, um navio commandado por D. Lucas Tantalo, excellente homem que teve toda a sorte de cuidados por mim prestando-me o que julgava ser-me util na minha posição.

Aceitámos os seus presentes com grande prazer, porque não tinhamos a bordo senão café que era o nosso unico alimento. Davam-me pois café a todos os momentos sem se importarem se isso era ou não conveniente para a minha doença. Comecei por ter uma febre assustadora acompanhada por uma grande difficuldade de engolir fosse o que fosse, o que não admirava, porque a bala atravessando-me o pescoço de lado a lado tinha passado entre as vertebras cervicaes e a pharinge. Decorridos oito dias n’este estado afflictivo, a febre havia diminuido, sentindo grandes melhoras.

D. Lucas tinha feito mais: partindo, deu-me cartas de recommendação para Gualeguay, — fazendo o mesmo a um seu passageiro chamado Arraigada, biscainho, que se achava estabelecido na America — e particularmente para o governador da provincia d’Entre-Rios, D. Paschal Echague, a quem por ter de fazer uma viagem, deixou o seu proprio medico, D. Romão Delarea, joven argentino, de muito merito, que examinando a minha ferida, e tendo sentido a bala do lado opposto áquelle por que tinha entrado, fez a extracção com toda a habilidade, tratando-me durante algumas semanas, isto é até ao meu completo restabelecimento, com os cuidados mais affectuosos e desinteressados.

Fiquei seis mezes em Gualeguay em casa de