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MULHERES E CREANÇAS

Não é só com as reprehensões, ás vezes asperas e sempre injustas, não é só encerrando os pobres seres pequeninos em espaço muito estreito para os seus desejos, é tambem vestindo-os para obedecer ao despotismo da moda, e ás exigencias da propria vaidade de um modo que está em pleno contraste com a idéa que todo o espirito um pouco sensato deve formar das aspirações e necessidades da infancia!

A creança, que quer e que precisa de correr no espaço amplo, pelas ruas pedregosas, pelos campos lavrados, pela matta cheia de raizes, traz quasi sempre uma botina alta, justa, de salto levantado e estreito! Ella, que aspira aos movimentos livres, que se compraz nos grandes gestos[1], que trepa ás arvores, que se roja pelo chão, que atira ao longe os improvisados projectis que encontra, sente-se cruelmente cingida por um fato rico, elegante, phantasioso, caro por força, e que tem o defeito duplo e contradictorio de a entristecer lentamente, inconscientemente pelas censuras e ralhos de que lhe é motivo incessante — visto que não ha nada mais avarento do que a prodigalidade e nada mais economico do que a ostentação — e de a tornar vaidosa pelo habito e pelo gosto de attrahir as vistas dos frivolos, e a inveja dos pobres, dos pequenos rotos, dos miseraveis de cinco annos, que ignoram as alegrias bemditas da sua liberdade indomada!

  1. "grande gestos" no original, erro tipográfico.