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seuerom (perf.) 10, certas (adv.) 83, caer 83, toste 81; tambem na Demanda são correntes certos phenomenos que só accidentalmente se encontram n-O Livro de Esopo, como: participios em -udo (perdudo 2, metuda 3, conheçuda 4, veudo 11, sabuda 86, — ao lado, todavia, de vyndo 11, e de conhocido 7, etc.); a particula er 5, 6, 34, 82; dei = deu 47, 93 (a par de deu, porém, p. 111, etc.); rem 20, 81.

Alem dos archaismos er, dei, rem e -udo, que só uma vez se lêem n-O Livro de Esopo, e que são communs, como disse, a elle e á Demanda, lê-se lá, tambem uma só vez, fuy, fab. xvi, 9 (se não é êrro), a par de foy; a fórma fuy, que vem nos Cancioneiros, por exemplo em D. Denis, v. 1575 e 1582[1], é já no tempo da propria Demanda completamente archaica[2].

A conclusão que creio que se deve tirar d’esses factos é que, por um lado, a lingoa do Fabulario ou O Livro de Esopo, no seu estado actual, fica entre a da Demanda do santo graall (mais antiga) e a do Leal Conselheiro (mais recente), e que, por outro lado, o nosso texto é até certo ponto modernização ou leitura nova de outro anterior, tendo escapado ao copista os archaismos citados; certamente a redacção primitiva data do sec. xiv. Comprehende-se que isto assim seja, pois que a lettra do manuscrito é do sec. xv, ao passo que a lingua tem caracteres do seculo antecedente.

Curioso é notar que, assim como n-O Livro de Esopo ha expressões que supponho vestigios de redacção anterior, tambem na Historia de Vespasiano, que, apesar de impressa nos fins do sec. xv, é talvez copia de um texto mais antigo[3], se observa avulsamente, dei = deu, p. 45, como n-O livro de Esopo. Em verdade, poderia suppôr-se dei êrro por deu; mas, como a cima temos factos paralelos, não é illogico acceitar essa fórma como real. Tambem na mesma Historia alternam fórmas verbaes em -des (2.ª pess. pl) e -es, aquellas mais antigas do que estas. Na Historia de Tungullo, ao lado dos participios em -ido, que são os normaes, occorre uma unica vez, como archaismo, derretuda[4].

  1. Ed. de Lang, Halle 1894. — Cfr. Ad. Coelho, Theoria da Conjugação, p. 93, onde tambem cita fui em um doc. do sec. xiii.
  2. Com a fórma foy coexiste na Demanda frequentes vezes foe: p. 12, 13, etc.
  3. Vid. a nova edição feita por F. M. Esteves Pereira, Lisboa 1905, p. 24.
  4. Vid. Rev. Lusitana, viii, 243 (art. de J. J. Nunes).