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conservação; em Coimbra a sua primeira parte acha-se dissolvida em prosa, tendo o final na sua fórma de lenga-lenga ainda a estructura poetica;[1] na ilha da Madeira repete-se uma versão inteiramente poetica mas um pouco obliterada na sua parte final.[2] Dos Açores recebemos algumas versões, entre ellas uma mais completa, que publicamos. Em um entremez, Récipe de pão, (1792) achamos uma referencia ao texto da Carochinha: «está posta todo o dia áquella janella, com uma mão sobre a outra, feita a Carochinha, e não se envergonha, sendo uma mulher viuva, e estar com os penteados tão indignos ao seu caracter.»[3] Eis a parlenda tal como anda nas versões insulanas:


A Carochinha

Era uma vez
A Carochinha,
Achou cinco réis
Ao varrer da cosinha.
A Carochinha
Poz-se á janella
A vêr quem queria
Casar com ella:

«Quem quer casar
Com a Carochinha,
Que ella é fermosa
E bonitinha?

Passou um porco:
— Quero-vos eu!
«Que comes tu?
— Do que Deus deu.
«Fó, fó, ó porco,
Eu não te quero;
Melhor marido
Que tu espero.

«Quem quer casar
Com a Carochinha,
Que ella é fermosa
E bonitinha?

  1. Contos populares portuguezes, p. 1 a 5.
  2. Romanceiro do Archipelago da Madeira, por Alvaro Rodrigues d’Azevedo.
  3. Tambem nos Ineditos de Alexandre de Gusmão, p. 274, se lê: «Digo que tudo são historias da Carochinha, e que sei mui bem o que sei.»