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ELEGIA XI.

Se quando contemplamos as secretas
Causas, por que este mundo se sustenta,
E o revolver dos ceos e dos planetas;

E se quando á memoria se presenta
Este curso do sol tão bem medido,
Que hum ponto só não míngua, nem s’augmenta;

Aquelle effeito, tarde conhecido,
Da lua na mudança tão constante,
Que minguar e crescer he seu partido;

Aquella natureza tão possante
Dos ceos, que tão conformes e contrarios
Caminhão, sem parar hum breve instante;

Aquelles movimentos ordinarios,
A que responde o tempo, que não mente,
Co’os effeitos da terra necessarios;

Se quando, emfim, revolve subtilmente
Tantas cousas a leve phantasia,
Sagaz escrutadora e diligente;

Bem vê, se da razão se não desvia,
Aquelle unico Ser, alto e divino,
Que tudo póde, manda, move e cria.

Sem fim e sem princípio, hum Ser contino;
Hum Padre grande, a quem tudo he possibil,
Por mais que o difficulte humano atino:

Hum saber infinito, incomprehensibil;
Huma verdade que nas cousas anda,
Que mora no visibil e invisibil.

Esta potencia, emfim, que tudo manda,