Página:Obras de Manoel Antonio Alvares de Azevedo v2.djvu/305

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A noite era muito alta — talvez me cressem um ladrão.

— É minha mulher que vai desmaiada.

— Uma mulher! Mas essa roupa branca e longa? Serás acaso roubador de cadáveres?

Um guarda aproximou-se. Tocou-lhe a fronte — era fria.

— É uma defunta.

Cheguei meus lábios aos dela. Senti um bafejo morno. — Era a vida ainda.

— Vede, disse eu.

O guarda chegou-lhe os lábios: os beiços ásperos roçaram pelos da moça. Se eu sentisse o estalar de um beijo... o punhal já estava nu em minhas mãos frias

— Boa noite, moço: podes seguir, disse ele.

Caminhei. — Estava cansado. Custava a carregar o meu fardo: e eu sentia que a moça ia despertar. Temeroso de que ouvissem-na gritar e acudissem, corri com mais esforço...

Quando eu passei a porta ela acordou. O primeiro som que lhe saiu da boca foi um grito de medo.

Mal eu fechara a porta, bateram nela. Era um bando de libertinos meus companheiros que voltavam da orgia. Reclamaram que abrisse.

Fechei a moça no meu quarto — e abri.

Meia hora depois eu os deixava na sala bebendo ainda.