Página:Obras de Manoel Antonio Alvares de Azevedo v2.djvu/346

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de amor com a sede da fera! seis meses! como foram longos!

Um dia achei que era demais. Todo esse tempo havia passado em contemplação — em vê-la, amá-la e sonhá-la: apertei minhas mãos jurando que isso não iria além — que era muito esperar em vão: e que se ela viria como Gulnare aos pés do Corsário, a ele cabia ir ter com ela.

Uma noite tudo dormia no palácio do duque. A duquesa, cansada do baile, adormecia num diva. A lâmpada de alabastro estremecia-lhe sua luz doirada na testa pálida. Parecia uma fade que dormia ao luar

O reposteiro do quarto agitou-se: um homem ai estava parado, absorto. Tinha a cabeça tão quente e febril e ele a repousava no portal.

A fraqueza era covarde: e demais, esse homem comprara uma chave e uma hora a infâmia venal de um criado; esse homem jurava que nessa noite gozaria aquela mulher: fosse embora veneno, ele beberia o mel daquela flor, o licor de escarlate daquela taça. Quanto a esses prejuízos de honra e adultério, não riais deles — não que ele ria disso. Amava e queria: a sua vontade era como a folha de um punhal — ferir ou estalar.

Na mesa havia um copo e um frasco de vinho: encheu o copo: era vinho espanhol — Chegou-se a ela, ergueu-a com suas roupas de veludo desatadas, seus cabelos a meio soltos ainda entremeados de pedraria e flores, seus