— Queres verificar? Apaguemos a luz e veremos o resultado.
Mauricio condescendeu.
A unica janella alumiada da Casa Mourisca envolveu-se nas trevas da noite.
Como o leitor já sabe, Bertha, por um motivo differente do insinuado por Jorge, apagou tambem pouco depois a luz do seu quarto. — Eu que dizia?—exclamou Jorge, rindo triumphantemente, mas como se aquelle rir lhe fizesse mal.
— Pois bem; se adivinhaste, tanto melhor — disse Mauricio, despeitado.
— Tanto melhor?!
— Sim. Porque não hei de eu vêr, n’este proposito de acompanhar a nossa vigilia, uma prova de sympathia pelo companheiro de infancia que hoje tornou a vêr?
— Ah! ah! Pensas n’isso?
— Porque não? Olha, Jorge, a mulher sem as fraquezas do coração proprias do sexo não é uma mulher perfeita. Eu, se visse anjos cá por este mundo, anjos puros, correctos, impeccaveis; tirava-lhes reverente o chapéo, benzia-me diante d’elles, rezava-lhes uma oração, mas afianço-te que não os amava.
— Boa noite, Mauricio. Olha que são duas horas.
— Adeus, Jorge.
— Não sonhes com Bertha.
— Não sonhes tu com a arithmetica, que é peior pesadêlo.
E os dois irmãos separaram-se, rindo.
A ambos dominou por muito tempo a imagem de Bertha.
Jorge passou uma noite febril. Tentava desfavorecer Bertha, quanto podia, no proprio conceito, esforçando-se por convencer-se de tudo quanto a respeito d’ella dissera ao irmão, para diminuir assim a impressão, que, a seu pesar, conservava ainda da imagem da rapariga.
Mauricio dera-lhe a entender que Bertha fôra sensivel ao seu galanteio, e esta ideia torturava o espirito de Jorge.