Página:Os Fidalgos da Casa Mourisca (I e II).pdf/146

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quando que as não cumpra, quem está no caso de ter vontade.

— Mas a vontade tira-se, se as authoridades forem o que devem ser.

— Viva, snr. regedor!

— Digo isto, snr. abbade, e...

— Um seu criado, snr. regedor!

— E um dia...

— Ás suas ordens, snr. regedor.

— Snr. regedor, sim! e honro-me d'isso muito. E emquanto fôr regedor, hão de me respeitar como tal. Já disse. O seu tempo já lá vae, snr. abbade, e hoje a justiça quando tem de entrar em uma casa, não repara no brazão que está á porta... ou não deve reparar. Ninguem tem direito de não respeitar a lei, e eu prometto-lhes, que já que assim o querem...

— Bem, bem — acudiu Mauricio, que receiou que a scena se tornasse mais azeda — não prosigamos n'esta contenda. Venham vocês d'ahi, que temos que conversar. Clemente, socega, que tudo se ha de arranjar. Adeus, Anna.

— Vamos lá, vamos lá — concordaram os dois primos, empunhando outra vez as espingardas — deixemos o snr. regedor que está hoje muito zangado.

E ao atravessarem o quinteiro o doutor e o abbade abraçaram, cada um por sua vez, uma das moças de Anna do Védor, que voltava da fonte com o cantaro de agua.

— Olá, olá, fidalguinhos! — bradou da porta da cozinha a patroa — já disse que isto aqui não é terras do Cruzeiro. Olhem se querem que eu os enxote como a rapozas do gallinheiro?

E quando a criada chegou ao pé d'ella, disse-lhes com aspereza:

— Tu não sabias chimpar-lhes o cantaro pela cabeça abaixo, minha maluca? Sempre vocês não sei para que querem a esperteza.

Os rapazes retiraram-se rindo.

Anna voltou a ouvir e a mitigar as queixas do filho.