— Quem me chama?
— Sou eu.
— Tu?! Jorge!
— Sim, pois quem havia de ser?
Mauricio caminhou ao encontro do irmão.
— Transportas-me de surpreza em surpreza! uns dias a seguir da janella do teu quarto o caminhar das nuvens, outros a errar á meia noite por entre as sombras dos bosques! Em que havia de dar a arithmetica!
— Cheguei ha pouco. Abafava lá dentro. Vim para aqui esperar-te, porque desejava conversar comtigo.
— O tom é grave e serio; é de crer que o assumpto corresponda.
— Não te enganas. É bastante serio o que tenho para dizer-te.
— Penetremos então na sombra druidica d'este bosque, para augmentar a solemnidade da scena.
— Peço-te que deixes para outra occasião as tuas observações joviaes; repito-te que é serio o que tenho a dizer-te.
— Pois aqui me tens serio como o assumpto. Falla.
Jorge guardou ainda por instantes silencio. Sob os passos dos dois irmãos ouvia-se estalar as folhas sêcas que alastravam o chão.
— Mauricio — principiou Jorge a final — Thomé procurou-me hoje para fazer-me um pedido.
— Hum! — atalhou Mauricio com meio riso — não me enganei, previ logo que se tractava d'isso.
— De quê?
— Fizeram-te queixa de mim, não é verdade? Pintaram-me como um lobo voraz rondando e assaltando o curral da tenra ovelhinha, creada com tanto mimo e recato? e tu, na tua inexperiente imaginação de rapaz serio, viste logo um drama pavoroso em tudo isso e distribuiste-me n'elle o papel de tyranno. Confessa que tudo isto é verdade.
— E estimaria bem que não fosse.
— É o que eu digo. Olha, Jorge, eu sou mais novo do que tu, mas, vivendo mais da vida commum da sociedade, não estou tão sujeito a vêr as coisas sob o co-