Página:Os Fidalgos da Casa Mourisca (I e II).pdf/190

Wikisource, a biblioteca livre

— Não creio verdadeira a vossa supposição, mas se o fosse...

— Que farias? Ora dize lá — perguntou o padre, piscando um olho emquanto esperava a resposta.

— Achava essa mulher tão desprezivel que...

— Pumba! Ora ahi temos outra. Na verdade ha nada tão desprezivel como uma mulher que abre a porta a qualquer pessoa de preferencia ao menino Mauricio, a joia dos namorados! — ponderou zombeteiramente o padre.

— Não quero dizer isso, mas...

— Pois, meu menino, prepara-te para o desengano, e volta ás priminhas dos Barrocaes, que essas são fieis.

— Ora, mas digam-me vocês uma coisa — insistia Mauricio — quem querem que seja o homem que possa estar já com Bertha n'esse tom de familiaridade?

— Não entremos n'essa questão. A seu tempo cahirão as cataratas.

— Já digo, eu não acredito.

— Pois nosso Senhor te dê sempre essa commoda incredulidade; antes de casar e depois de casar.

E entre os tres ficou pactuada para aquella noite uma espionagem cerrada á casa de Thomé, com o fim de reconhecerem a mysteriosa visita.

Mauricio passou o dia todo pensativo e preoccupado com a revelação que os primos lhe fizeram.

Ainda quando Bertha não tivesse adquirido grande preponderancia sobre os pensamentos de Mauricio, bastaria a ideia de que outro o preterira no coração de uma mulher, a quem elle havia dedicado um olhar de galanteio, para devéras o irritar.

Mas, de justiça é que se diga, o amor, a paixão, a inclinação, o capricho, ou como mais rigoroso nome tenha, o sentimento de Mauricio para Bertha attingira a maxima intensidade, a que podiam subir os affectos d'aquelle caracter voluvel. Se não amava ainda devéras, é certo tambem que nunca amára melhor. Bertha demais possuia sobre as outras mulheres, que nas épocas successivas haviam reinado na imaginação d'este rapaz, o prestigio das recordações de infancia, a distincção de