Página:Os Fidalgos da Casa Mourisca (I e II).pdf/208

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cepção e na da apresentação de Gabriella a todos os primos, que ainda não a conhecessem.

Frei Januario explicára a ausencia do fidalgo, attribuindo-a a incommodos habituaes, que sómente mais tarde lhe permittiam sahir dos aposentos.

A verdade, porém, era que D. Luiz desejava encurtar, quanto lhe fosse possivel, o tempo em que tinha de conviver com os seus parentes n'aquelle dia dedicado aos deveres de hospitalidade.

Produziu alvoroço na sala a entrada de D. Luiz.

Todos correram a comprimental-o com aquella deferencia, que a indole séria e melancolica do fidalgo e a evidente superioridade da sua intelligencia e educação a todos impunha.

— Como vaes tu, D. Luiz? — disse, apertando-lhe a mão um ex-coronel de milicias, que havia acabado, pouco tempo antes, de ameaçar com a espada que tinha em casa na gaveta todas as constituições do mundo.

— Graças a Deus que déste signal de vida, homem!

— O primo D. Luiz devia procurar mais distracções — acudiu a vigesima descendente de um dos guerreiros de Ourique.

— Ainda bem que a priminha Gabriella o veio tirar do seu lethargo — acrescentou outra, ramo infructifero de arvore igualmente illustre.

O titulo de baroneza raros o concediam a Gabriella, porque era de origem suspeita para aquelles pechosos aristocratas.

D. Luiz respondeu com um forçado sorriso aos comprimentos, dizendo:

— Devem procurar-se as distracções, quando o espirito não se dá bem com as ideias tristes. Mas isso não succede commigo. Já não posso viver sem esta escura companhia dos meus pensamentos. O esforço para fugir-lhe mais me afflige.

— Ora essa! Sentir-se um homem bem com a tristeza! Ora essa! — estranhou o ex-miliciano.

— São contradicções apparentes — disse Gabriella para o tio. — As saudades teem d'isso. Por isso lhes chamaram «gosto amargo e pungir delicioso.»