emprezas agricolas, do que nos pardieiros em ruinas dos nossos morgados, em cujas velhas salas dormem os proprietarios o somno da ignorancia, da inutilidade e da devassidão.
- Não o nego, mas... na nossa casa, naquella triste Casa Mourisca, ha um quê de poesia, de poesia elegiaca, se assim quizeres. Essa de que fallas será a poesia das georgicas; mas a da elegia deixa-m'a ficar.
- O peior, Mauricio, é que um dia virá talvez em que o tremendo prosaismo da completa miseria dissipará esse tenue perfume que dizes.
- Safa! Estás hoje com uns humores de Cassandra, Jorge! Deixa lá; lembra-te de que se diz que nas nossas propriedades ha um thesouro escondido desde o tempo dos mouros, e que um dia alguem de nossa familia o achará, ficando fabulosamente rico. Que essa esperança dissipe o humor negro que tens. Vamos, vem d'ahi. Pega n'esta espingarda e vae caçar. É bom para dissipar visões.
- Não estou hoje para caçar.
- Então vaes reatar aqui o fio das tuas cogitações?
- Não, vou reatal-o acolá.
- Vaes á Herdade?!
- Vou.
- Fazer o quê?
- Vêr de mais perto aquella poesia, ou aquella prosa, como quizeres.
- Sabes que o pae não gosta que lidemos muito de perto com o Thomé?
- Sei. É um preconceito. Elle não o saberá.
- Um preconceito! Bom! Estás hoje muito philosopho. Adeus, Jorge; espero vêr-te ao jantar de melhor aspecto.
- Adeus, Mauricio.
E os dois irmãos separaram-se. Mauricio, precedido pelos cães, seguiu em direcção dos montes, cantando. Jorge desceu a collina e caminhou para a Herdade.