Foi o apparecimento de Jorge.
A scena passára-se em uma sala contigua á do cartorio da casa, onde desde pela manhã Jorge se encerrára a examinar uns papeis de importancia. O padre suppunha-o fóra, e por isso promovêra aquella reunião, prestes a tornar-se tumultuosa. Assim pôde Jorge ouvir tudo.
Percebeu a necessidade de fazer cessar aquella scena escandalosa, e terminal-a airosamente, embora á custa de algum sacrificio. N'esta resolução levantou-se e abriu de par em par a porta pela qual communicavam as duas salas.
Assim que o viram, os criados emmudeceram. O padre julgou-se perdido.
Jorge dirigiu-se placidamente áquelles.
—Quando o snr. frei Januario lhes disse que me procurassem para serem pagos do que se lhes deve, era melhor que o fizessem logo, e não levantassem esse clamôr proprio de uma feira. Entrem, que eu aqui estou para lhes fazer contas.
E a um gesto imperioso de Jorge, os criados entraram timidos no gabinete, occultando-se uns com os outros.
—Entre tambem, frei Januario—disse Jorge ao padre, que procurava retirar-se sorrateiramente da sala.
O padre teve de obedecer, a seu pesar.
Jorge sentou-se á mesa e principiou a interrogar os criados, um por um, sobre a quantia que se lhes devia, e pagando-lh'a integralmente, depois de obtida a informação.
Assim os correu e satisfez a todos, á excepção do hortelão, que o estava a observar calado e com os olhos humidos.
Jorge voltou-se para elle e disse-lhe:
—Estou que te fazia offensa, se te pagasse ao mesmo tempo que a estes desconfiados. Tu és dos que esperam com esta garantia.
E estendeu-lhe a mão francamente aberta.
O hortelão quasi se precipitou para ella e apertou-a commovido nas suas.