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OS MAIAS
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cabra, chale aos hombros, e lá ia para a relva, com qualquer!... Que bello romance para o Ega!

Voltou; tornou a abrir devagarinho o portão: de novo subiu, amollecendo os passos, a sombria rua d’acacias. Mas agora ia sentindo uma hesitação em contar a Maria aquelle horror. A seu pezar pensava que tambem Maria o esperava, com o leito aberto, no silencio da casa adormecida; e que tambem elle penetrava alli, ás escondidas, como o homem da manta... De certo era bem differente! Toda a immensuravel differença que vai do divino ao bestial... E todavia receava despertar os melindrosos escrupulos de Maria, mostrando-lhe, parallelo ao seu amor cheio de requintes e passado entre brocados côr d’ouro, aquelle outro rude amor, secreto e illegitimo como o d’ella, e arrastado brutamente na relva... Era como mostrar-lhe um reflexo da sua propria culpa, um pouco esfumada, mais grosseira, mas parecida nos seus contornos, lamentavelmente parecida... Não, não diria nada. E a pequena?... Oh, nas suas relações com Rosa a creatura continuaria a ser, como sempre, a puritana laboriosa, grave e cheia d’ordem.

A porta envidraçada sobre o jardim tinha ainda luz: elle atirou aos vidros uma pouca de terra solta, depois bateu de leve. Maria appareceu, mal embrulhada n’um roupão, juntando os cabellos que se tinham desenrolado, e meia adormecida.

— Porque vieste tão tarde?