Página:Os trabalhadores do mar.djvu/210

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Conheciam-se acaso entre si, aquellas creaturas? Não; farejavam-se.

A dona da casa era uma mulher moça, assaz bonita, trazendo um barrete ornado de fitas, lavada ás vezes com agua do poço, e tendo uma perna de páo.

Desde madrugada esvasiava-se o pateo; iam-se embora os freguezes.

Havia no pateo um gallo e algumas gallinhas, que esgaravatavam no esterco durante o dia. O pateo era atravessado por um barrote horisontal, collocado sobre postes, figura de força, que não estava alli em terra estranha. Via-se ás vezes estendido no barrote, no dia seguinte ás noites chuvosas, um vestido de seda molhado e enlameado, pertencente á mulher da perna de páo.

Acima da palhoça, e, circulando o pateo, havia um andar superior e acima do andar um celeiro. Subia-se até lá por uma escada de madeira podre que furava o tecto; escada vacillante por onde subia com estrepito a mulher côxa.

Os locatarios de arribação, por semana ou por noite, moravam no pateo; os locatarios residentes moravam na casa.

Janellas, nem um caixilho; portas, nem uma hombreira; lareiras, nem um fogão; era a casa. Passava-se de um quarto a outro indifferentemente por um buraco quadrado e comprido que fôra porta, ou por uma fresta triangular que ficava entre duas pilastras do tabique. A caliça cahida cobria o assoalho. Não se sabia como aquella casa estava em pé. O vento não a abalava. Mal se podia subir pela escada gasta, e escorregadia. Tudo estava aberto. O