& que nauios de Portugueſes tinha
tomado, & quantos homẽs mortos,
& que fazenda roubada; diſſe que de
ſete annos a eſta parte, o primeyro
nauio que tomara fora o junco de
Luys de Pauia no rio de Liampoo,
com quatrocentos bares de pimenta
ſem droga nenhũa, onde matara dezoito
Portugueſes, a fora os ſeus eſcrauos,
de que não fazia caſo, por não
ſerem gente que o ſatisfizeſſe no que
tinha jurado, mas que deſpois por
conjunçoẽs de acertos que achara no
mar, tomara mais quatro embarcaçoẽs,
nas quais matara perto de tre
zentas peſſoas, mas que Portugueſes
não ſerião mais que ſetenta, & que
lhe parecia que podia chegar o que
tinha tomado de mil & quinhentos
atè mil & ſeiſcentos bares de pimenta,
& outra fazenda, da qual el Rey
de Paõ lhe tomara logo mais de a
metade pelo recolher em ſua terra, &
ſegurar dos Portugueſes, dandolhe
para iſſo aquelles cem homẽs que andauão
com elle, & lhe obedeceſſem
como a Rey. E perguntado ſe matara
mais Portugueſes, ou dera fauor
para iſſo, reſpondeo que não, mas q̃
eſtando auia dous annos no rio do
Choaboquec na coſta da China, fora
ahy ter hum junco grande com muytos
portugueſes, de que era Capitaõ
hum homem muyto ſeu amigo que
ſe chamaua Ruy Lobo.que dõ Eſteuão
da Gama Capitaõ de Malaca
mandara de veniaga, o qual deſpois
de ter feita ſua fazenda ſe ſayra do
porto embandeirado por yr muyto
rico, & que auendo ja cinco dias que
era partido, lhe abrira o junco hũa
agoa muyto groſſa, & não a podendo
vencer, lhe fora forçado tornar a
demandar o porto donde partira, &
vindo com vento rijo infunado com
todas as vellas, por chegar mais depreſſa,
ſe lhe fora ſupitamẽte ao fun
do, de que ſe ſaluara o Ruy Lobo cõ
dezaſſete Portugueſes, & algũs eſcrauos,
& viera ter na Champana ao
ilheo de Lamau ſem vella, nem agoa,
nem mantimento algum. E confiado
o Ruy Lobo na amizade antigua q̃
com elle tiuera, lhe pedira em joelhos
chorando que o quiſeſſe recolher no
ſeu junco, em que naquelle tempo eſtaua
de caminho para Patane, porq̃
lhe prometia, & aſsi lho juraua como
Chriſtaõ de lhe dar por iſſo dous mil
cruzados, o que elle aceitara, mas q̃
deſpois de o ter recolhido, fora aconſelhado
pelos Mouros q̃ ſe não fiaſſe
em amizade de Chriſtaõ, ſe naõ queria
perder a vida, porqire como cobraſſem
mais forças, lhe auião de tomar
o junco com quanta fazenda leuaua,
porque aſsi o cuſtumauão de fazer
em todas as partes onde ſe achauão,
pelo qual receoſo elle de poder
vir a ſer o q̃ os Mouros lhe dizião, os
matara hũa noite a todos eſtãdo dormindo,
de que deſpois ſe arrepẽdera
muytas vezes. Antonio de Faria, &
os mais q̃ eſtauão à roda ficaraõ taõ
paſmados, quanto hum tão feyo &
inorme caſo o requeria, & não o querendo
mais inquirir, o mandou a elle
& aos quatro; que inda eſtauão viuos,
matar, & lançar ao mar.