Página:Turbilhão (Coelho Netto, 1919).djvu/174

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O menor incidente para aquele bando passivo assumia o caráter de uma revelação superior; de tudo tiravam presságios, descobrindo nos mais ligeiros e insignificantes ruídos - o sussurro da chama do gás que o vento vergava, uma folha de papel que voava, o rangido de uma porta, influências misteriosas de espíritos visitadores. O homem, todo de preto, com uma barba curta, olhinhos miúdos, profundamente encovados, vivíssimos, o cabelo escorrido, empastado na testa, com o cotovelo fincado na mesa, a fronte apoiada na palma da mão, folheava atentamente um livro.

Um dobre de sino rolou longamente. Alguém suspirou com sofrimento: "Ai! meu Deus". Cabeças voltaram-se, curiosas daquela mágoa e o infeliz, um velho esquelético, de grandes barbas amarelecidas, pendeu a cabeça sobre o peito, como a um peso grande e insuportável.

Lentamente o homem pôs-se a ler uma passagem evangélica. As palavras saíam-lhe da boca engroladas, quase ininteligíveis; por vezes eram como um murmúrio, e todos tinham os olhos nele, imóveis, extáticos. Uma criança rompeu em pranto e, como se quisesse aproveitar aquele rumor, que interrompia a pregação, o enfermo, encantoado, pôs-se a tossir cavernosamente.

Em passos surdos um homem atravessou a sala - os sapatos gastos, sem salto, não faziam