Página:Turbilhão (Coelho Netto, 1919).djvu/187

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com pobreza e descuido. Todos os olhares seguiam-no com interesse, e ele passava d'esguelha, por entre os devotos, limpando as mãos a um grande lenço vermelho de barra florida.

— É o irmão Canedo, disseram.

O homem sentou-se, de costas para a assembléia, impôs as mãos a mesa, fechou os olhos, apertando muito as pálpebras, e quedou, como adormecido, dominado por todos aqueles olhares fixos, que o envolviam em fluidos.

Súbito, entrando em crise, atirou violentamente a cabeça para trás, sorvendo um fôlego, pôs-se a tremer e, em voz fraca, murmurou:

— Que a paz do Senhor seja convosco!

Correu um sussurro por toda a sala e o homem, sob o prestígio das forças espirituais, pôs-se a falar, aos arrancos, profeticamente, com frases laceradas:

— Muitos dos que aqui se acham, conheceram-me enquanto andei nesta vida de torturas...

O apóstolo interrogou:

— Quem és? Quem foste?

E o médium declarou:

"Que se chamara Amaral. Fora do Correio..." e, pausadamente soturnamente, agoniado, entrou a falar da revolta de setembro, lamentando a carnificina, as depredações, as vinganças, os atentados covardes, a tristeza das viúvas, o abandono