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MONTEIRO LOBATO

do a corôa viva da rainha das aguas. Joia bela assim, pensou Pedrinho, nenhuma rainha da terra jamais possuiu. A tonteira que a vista da Iára causa nos mortais tomou conta dele. Esqueceu até do seu plano de olhar com um olho só. Olhava com os dois, arregaladissimos, e cem olhos que tivesse com todos os cem olharia.

Enquanto isso, ia o saci se aproximando da Mãe d’Agua, cautelosamente, com infinitos de astucia para que ela nada percebesse. Quando chegou a poucos metros de distancia, deu um pulo de gato e nhoc! furtou-lhe um fio de cabelo.

O susto da Iára foi grande. Desferiu um grito e precipitou-se nas aguas, desaparecendo.

O saci não esperou por mais. Com espantosa agilidade de macaco, aos pinotes, saltando as pedras de duas em duas, de tres em tres, num momento se achou no ponto onde Pedrinho, ainda no deslumbramento da beleza, jazia de olhos arregalados, imovel, feito uma estatua.

— Louco! exclamou o saci lançando-se a ele e esfregando-lhe nos olhos um punhado de folhas colhidas no momento. Não fosse o acaso ter posto aqui ao meu alcance esta planta maravilhosa e você estaria perdido para sempre. Louco, dez vezes louco, louquissimo, que você é, Pedrinho! Por que me desobedeceu?

— Não pude resistir, respondeu o menino logo que a fala lhe voltou. Era tão linda, tão linda, tão linda, que me considerei feliz de perder até os dois olhos em troca do encantamento de contempla-la por uns segundos.

— Pois saiba que cometeu uma grande falta. Não devia pensar unicamente em si, mas tambem na pobre dona Benta, que é tão boa, e na sua mãe e em Narizinho. Eu,