A Boa Esposa
A pequena sala forrada de um verde de folhas é como uma grande caixa de confeitaria. Aqui e ali, — azuis, vermelhos, amarelos, brancos, de todas as cores, — os bombons das almofadas. A um canto, encostado à parede, entre o "abat-jour" e a estante de músicas, longo como uma "tablette" de chocolate, o divã em que Mme. Efraim se recosta. A claridade rósea do "abat-jour" discretamente descido, a sua figura de rainha Tomiris destaca-se em linhas mais doces. É fina e esbelta como uma silhueta egípcia. Descendo-lhe pelo colo, a blusa de seda quase não faz o esforço de uma prega para saltar os dois planaltos dos seios. Aberto em V, o decote chega-lhe quase ao estômago, com a franqueza de uma porta de casa vazia, em que não há nada que se roube ou se veja. O cabelo, cortado à altura da orelha, é liso e negro, e comprime-se, sem protesto, sob o aro de ouro e pedrarias de um diadema, que é como uma roda de bastidor da fada Briolanja em que os vagalumes houvessem pousado... A seus pés, de joelhos, arrastando no tapete sor de morango as abas do fraque cinza, o visconde de Bastos Penha agita os lábios numa súplica nervosa, que só ela ouve.
— Já não é por mim, Helena, que eu te peço esse sacrifício... Tu amas, tu adoras o teu marido... É por isso, pois, que eu peço... Abre-me os teus braços... oferece-me a tua boca... deixe que a minha cabeça repouse na suavidade morna dos teus seios...
Duas mãos, como duas borboletas, descem, brandas, sobre a cabeça do rapaz, e comprimem-lhe o rosto magro e moreno, atraindo-o docemente. Os lábios quentes, em que o "rouge" põe um gosto de fruta, esmagam-se na sua boca.
— Vem! — geme a moça, num arrepio, — vem! Não é por ti... é por ele!...
E, atraindo-o ainda mais, os olhos cerrados:
— Meu marido gosta tanto de crianças!...