A Esperança Vol. I/Resentimento
Continua a minha amiga cultivando o espirito, ora lendo, ora escrevendo e dando-nos o prazer de vermos algumas das suas lindas producções publicadas.
Bem haja minha amiga que engrandece assim o seu sexo servindo-lhe d'incentivo para imittal-a. Anime-nos minha amiga, diga-nos que escrevamos, pois não falta quem nos censure e nos mande concertar as meias!... Será receio que o nosso sexo venha um dia a offuscar a sua gloria? Se assim é, não devemos descorsôar por que nos dá isso a certesa de termos as mesmas faculdades e de podermos raciocinar como elles, deixar expandir o noss pensamento e compôr tambem um romance, tirar sons da lyra e quem sabe?.. Compôr até um poema! Mas não; nós não devemos fallar em semilhantes cousas que nos não e permittido! O sol nasce só para elles; as lagrimas que a aurora derrama sobre as flôrinhas e a relva são elles só que as querem ver e espargir, ergendo-se a maior parte das vezes quando o astro do dia vai já em meio do seu giro! e nós que nos levantamos ao raiar d'aurora, não nos é concedido contemplar esse bello quadro e descrevel-o inspiradas pela mão occulta do Creador que se revela com tanta magestade em meio da naturesa!
O parnazo é pouco para os nossos poetas, as muzas são-lhes todas precisas; não nos cedem a nós, nem sequer a mais debilitada!
Que sejam mais indulgentes comnosco, que nos deixem lêr e escrever, que nos sobra ainda tempo para fiar.
Não ha ninguem que não tenha as suas horas d'ocio e essas podemos empregal-as como nos approuver. Que lucram elles com a estupidez da mulher? Não lhes será mais agradavel conversar com ella sendo instruida? Não educará melhor os seus filhos fazendo com que elles se desenvolvam mais depressa, corrigindo-os, já na leitura, já na conversação e ensinando-lhes as lições antes d'irem para as aulas?
Longe de nós a ideia de querermos competir com os homens litteratos; não são essas as nossas aspirações que não temos estudos nem talento para isso; nós somos as que lêmos com prazer os seus escriptos, somos as suas admiradoras e humildes discipulas, o que nós não podemos, nem queremos aprender, é o seu orgulho!
De v. exc.a
amiga muito affectuosa,
Maria Adelaide Fernandes Prata.