A Esperança Vol. I/Vozes do coração
Eu tive um filho só, nasceu formoso,
Era as minhas delicias, meu thesouro,
Ufana eu o estreitava entre meus braços,
Com orgulho ás amigas o mostrava,
Não o trocava a um reino, ao mundo inteiro!
Da terra nada mais ambicionava!
Apenas tinha um anno e o doce nome
De mãe balbuciar, ébria de goso
Então lhe ouvi, ficando indemnisada
Das fadigas que à mãe um filho custa
E qual lindo botão desabrochando,
Cada vez mais gentil o vi crescendo,
Divisando-lhe fino entendimento;
Mas ah! Mãe desditosa que tormentos
A sorte mais cruel te preparava!...
Que nuvem carregada a tua estrella
Veio eclipsar! N'um pélago de trevas
P'ra sempre tuas ditas sepultando!...
Que terrivel martyrio o cruel fádo
Nas horridas cavernas te ideava...
Um dia era de Julho, fatal dia!
E mal que despontava a aurora alegre,
Levantei-me deixando o tenro infante
Que junto a mim dormia, repousando
E no mister caseiro alguns instantes
Eu empreguei aos servos dando as ordens
E após, junto ao leito de meu filho
Cuidadosa volvi p'ra meus carinhos
Prestar-lhe ao despertar, vel-o sorrir-me;
Porém, qual foi meu 'spanto, o meu martyrio
Ao ver-lhe enfermidade estranha, horrivel!
E todo em contraçoes o debil corpo,
Já perdendo os sentidos, semi-morto!
Dos olhos vi sumir-se-lhe a retina
E a formosa boquinha a um lado posta!
Ora tomava a côr d'um moribundo
Outras vezes da rosa purpurina;
Da fronte lhe manavam vastas gottas
D'abundante suor frio, nocivo
Horas nove lhe dura o ataque infausto,
Sem que da medicina os vas recursos
Lhe podessem conter os soffrimentos!
E d'angustias cercada, eu delirante,
Loucas phrases soltei que o ceu irado
Por ellas me puniu; pois que prostrada,
Do filho meu a vida lhe pedia,
Que m'o restituisse mesmo a custo
De tormentos infindos, dôr. martyrios,
De noutes mal dormidas, de fadigas
Incessantes, com tanto elle vivesse;
E Deus que mais um anjo ambicionava
A vida lhe deixou p'ra meu castigo!...
Porque aos decretos seus, oasei oppôr-me!
Elle vive; ai de mim! Mas em que estado!
Jamais deixou o miserando infante
De ser por tal molestia perseguido,
Enfermidade horrivel, incuravel,
Ataques produzindo, uns, após outros
Que s'augmentou quando um lustro contava.
Do lado esquerdo, leso, eis elle fica
E pouco a pouco o tino foi perdendo
E de todo a memoria, logo a falla!
P'ra sempre emmudeceu! e o som suave
Da sua voz jamais ouvir-lhe pude!
Então da infeliz mãe perdendo a idéa,
Não mais a conheceu! Nem lhe sorriran
Seus labios nunca mais!.. E em vez d'afagos
Reppelle a mal fadada e a martyrisa!..
Diversas são agora as preces minhas,
Que me não sobreviva, a Deus só rogo; g
Porém, Deus nãome attende!..e eu soffro..soffro!..
E junto d'elle vou passando triste,
De meus annos a flor vejo murchar-se,
Sem ventura extinguir-se o sol da vida!..
Maria Adelaide Fernandes Prata.